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São Paulo, quinta-feira, 06 de fevereiro de 2003

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SP ILEGAL

Escavação de garagem foi feita em área pública e escondida por parede de gesso; local foi fiscalizado em dezembro passado

Fiscal não vê obra irregular de 4.300 m2

SÍLVIA CORRÊA
SÉRGIO DURAN

DA REPORTAGEM LOCAL

Uma das maiores incorporadoras de São Paulo escavou irregularmente -sob um terreno público- quatro pavimentos de garagem de 1.075 m2 cada um no meio da Vila Olímpia -um dos metros quadrados mais caros da cidade- sem que ninguém tenha feito nada para impedir a obra.
Pior: por ordem da CPI da Operação Urbana Faria Lima, a fiscalização da Subprefeitura de Pinheiros esteve no local na terceira semana de dezembro, mas o chefe do setor na subprefeitura diz que o buraco de quatro pavimentos e 4.300 m2 -o equivalente a 16,4 quadras de tênis- não foi visto.
O prédio em questão, na rua Funchal, foi batizado de e-Tower -um empreendimento de R$ 70 milhões. Será o terceiro edifício mais alto de São Paulo -38 andares em 144 metros de altura, com 30% do total já executado.
O chefe da fiscalização da Subprefeitura de Pinheiros, engenheiro Maurício Monteiro, justifica a falha de vistoria do prédio citando a existência de uma parede de gesso chapiscada de cimento, atrás da qual a incorporadora escondeu a garagem irregular. A parede simula que a obra termina no perímetro aprovado pela Prefeitura de São Paulo -antes de invadir o subsolo público.
A versão do engenheiro -de que a parede impediu a visão do buraco ilegal- é corroborada pela incorporadora da obra e autora da irregularidade, a Munir Abbud Empreendimentos Imobiliários, empresa que está no mercado há 30 anos e já construiu 2.000 unidades de alto padrão, entre elas o hotel Paulista Wall Street.
A empreiteira, no entanto, não forneceu à reportagem a data exata de construção da parede de gesso, afirmando apenas que ela ocorreu "há seis ou sete meses". A prefeitura, por sua vez, recusou-se a dizer em que dia foi feita a fiscalização que não notou a irregularidade. Por fim, a Arte Final, empresa que fez a divisória camuflada, diz apenas que prestou o serviço "recentemente" para dar "um socorro" à Tecnum Corporate -construtora contratada para a obra pela Munir Abbud.
O buraco, admite a própria construtora, começou a ser feito em meados de 2001, no início da obra. Mas a irregularidade só começou a vir à tona na última sexta, quando a Subprefeitura de Pinheiros e a Folha receberam a denúncia do caso, feita pela ex-mulher de um dos empreiteiros.
Na segunda, o jornal procurou a subprefeitura, que apenas na terça visitou a obra. A vistoria foi feita por Maurício Monteiro, que foi administrador regional do Jabaquara na gestão de Paulo Maluf (1993-96) e de Pinheiros na gestão Celso Pitta (1997-2000).
Homem forte dos últimos oito anos de governo, ele continua comandando a fiscalização de Pinheiros -unidade na qual trabalhava Marco Antonio Zeppini, o então chefe da fiscalização que foi preso em 1998 no episódio que deu origem ao esquema de corrupção que ficou conhecido como "máfia da propina".
Na vistoria feita após a denúncia, Monteiro diz ter determinado que fosse feito um buraco na parede de gesso. Encontrou atrás dela a enorme câmara até então escondida. A Folha não teve acesso ao subsolo da obra.
O engenheiro não achou no local o projeto aprovado que permitia a escavação -até porque a incorporadora não o possui- e deu 48 horas para que a empreiteira o apresentasse à subprefeitura.
No Código de Obras não há nenhuma previsão legal para que a empresa tenha esse prazo. A legislação determina que, constatada a irregularidade pela execução da obra ou pela falta de documentos que a justifique, o poder público deve autuar o construtor, intimá-lo a apresentar a documentação necessária e, até que isso ocorra, embargar a obra. À Folha, porém, Monteiro disse que dar o prazo é uma orientação da prefeitura.
Ontem, dia seguinte à fiscalização, a Munir Abbud protocolou um projeto modificativo na Secretaria Municipal da Habitação. Ele prevê a escavação do subsolo público -que não tem suporte legal. A Subprefeitura de Pinheiros deve embargar hoje as obras, e a incorporadora pode ser obrigada a aterrar o buraco.
A Munir Abbud poderá pagar multa de cerca de R$ 300 mil pela obra irregular.
Jefferson Abbud, 43, sócio-diretor da incorporadora, admite a irregularidade, mas alega que a empresa escavou o subsolo público apostando na aprovação de um projeto de lei que alteraria o traçado da rua Funchal.
O projeto, segundo ele, foi apresentado em 2000 e tramita na Câmara Municipal sob o número 5.694. Não há, no entanto, nenhum projeto com esse número.


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