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OPINIÃO
Saúde é coisa séria
ROBERTO GOUVEIA
Desde a Constituição de 88, o
Sistema Único de Saúde é concebido como um sistema misto público, podendo contratar ou conveniar serviços privados. A Carta
afirma que a assistência à saúde é
livre à iniciativa privada. Falar em
parceria na área, desde então, não
é coisa nova. De lá para cá, aprofundamos nossas definições de como o setor privado deverá participar da prestação de serviços.
O Estado de São Paulo foi o primeiro do país que, com a aprovação do Código de Saúde, em 1995,
traçou a linha divisória entre parceria e promiscuidade na relação
entre o público e o privado.
O SUS recorrerá à participação
complementar privada quando a
sua capacidade instalada for insuficiente para dar conta da demanda. Só participará a entidade que
tiver serviços próprios de assistência à saúde e, portanto, agregar capacidade ao sistema. É vedada
qualquer forma de transferência
da execução ou gestão de serviços
públicos a entidades privadas.
Parceria é uma relação na qual
os dois parceiros devem auferir
vantagens, em benefício do interesse maior da saúde da população. Como autor do código, é com
muita preocupação que vejo o
projeto enviado pelo governador à
Assembléia, em que se pretende
ceder a entidades privadas ("organizações sociais") prédios e recursos públicos, equipamentos e servidores, além de isenção fiscal.
A proposta se inspira na polêmica medida provisória do ministro
Bresser Pereira. Em atraso em relação a alguns Estados, o PSDB de
São Paulo, por meio de seus brilhantes ideólogos, conseguiu piorar os termos da proposta federal.
O Executivo paulista praticamente extinguiu o controle público do processo. O Conselho Estadual de Saúde, instância máxima
de participação da comunidade no
SUS, nem é citado. As OS são concebidas como entidades marcadamente privadas, mesmo sem fins
lucrativos. Não se trata de espaço
público não-estatal, e sim de uso
privado do patrimônio público.
Só os secretários da Saúde e da
Administração terão poder discricionário para, de forma unilateral,
escolher qual será considerada OS
para receber a concessão dos serviços públicos (flagrante afronta
às constituições e às leis). O contrato de gestão será apresentado
pela OS ao secretário, em vez de a
iniciativa caber ao poder público.
Garantiu-se ao máximo o interesse da entidade privada nascente.
Não somos contra parcerias nem
temos uma visão estatizante, mas
não compraremos gato por lebre.
Queremos fazer valer os princípios da universalidade, equidade e
integralidade dos serviços de saúde. Como veio, o projeto não passará. Estamos abertos ao debate.
Vamos a ele, sem arroubos ideológicos ou subterfúgios.
Roberto Gouveia, 42, médico e sanitarista, é
deputado estadual pelo PT de São Paulo
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