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LETRAS JURÍDICAS
O Jardim Irene de cada um
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
A gestão democrática dos
núcleos urbanos é um dos
grandes princípios impostos -a
contar da Constituição- pelo Estatuto da Cidade. Não se trata
apenas de um princípio, mas de
determinação essencial para
orientar a política urbana, na
qual devem interferir todos os interesses legítimos. Seu objetivo
consiste em encontrar o termo
médio que mais satisfaça as necessidades do povo, reduza diferenças e assegure, pelo menos, serviços públicos a todos os munícipes. Nisso, é bom notar, as metrópoles e os pequenos municípios
são focos da mesma atenção.
O estatuto, conforme aqui se insistiu mais de uma vez, garante a
gestão democrática da cidade
(artigo 43) através de vários instrumentos, entre os quais se incluem órgãos colegiados de política urbana nos níveis nacional, estadual e municipal. É natural a
interferência dos três segmentos
de governo, porque nenhuma cidade é provida de auto-suficiência.
A verdadeira gestão democrática reclama participação vigorosa
dos cidadãos, que se devem organizar, agrupar-se segundo interesses locais e regionais, para influir em debates, audiências, consultas e conferências públicas, tornados obrigatórios para a feitura
e a aplicação das leis. Os subnúcleos populacionais de cada cidade que se derem ao "luxo" de se
omitir serão certamente mandados a escanteio pelos que se mostrarem mais atuantes. E, por falar
em escanteio, o jogador de futebol
Cafu, capitão da seleção brasileira, deu exemplo de cidadania cuja importância transcende o âmbito do próprio Estatuto da Cidade. Pediu que, antes de receber a
taça de campeão mundial, fosse
escrito em sua camiseta "100%
Jardim Irene". Do outro lado do
planeta, chamou a atenção para
um bairro pobre, do qual muitos
paulistanos nunca tinham ouvido falar -estou nessa lista-,
com sérios problemas urbanos,
que luta pela melhora de suas
condições e deseja implementos
de infra-estrutura a que todo cidadão tem direito para realizar a
exigência mínima de morar dignamente. O cidadão Marcos
Evangelista de Moraes, conhecido
no mundo como Cafu, mostrou a
força da consciência social revelada, ele, que, além de tudo, mantém uma fundação em benefício
da periferia em que nasceu e viveu até os 22 anos.
O Estatuto da Cidade aceita a
iniciativa popular não só para
projetos de lei como também para
planos, programas e projetos de
desenvolvimento urbano, ampliando as formas de participação
possíveis. Dois elementos são relevantes para dar força à integração dos cidadãos. O primeiro deles é o processo penal contra administradores que ofendam o estatuto, sujeitando-os a penas severas. O segundo está no artigo
44, pelo qual a gestão orçamentária participativa municipal incluirá a realização de debates,
audiências e consultas públicas
sobre as propostas do Plano Plurianual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e do Orçamento
anual como condição obrigatória
para sua aprovação.
O cidadão terá a possibilidade
de se manifestar sobre a vinculação dos gastos no Orçamento e
sua aplicação no curso de cada
exercício fiscal. A regra vale para
cidades, regiões metropolitanas e
mesmo aglomerações urbanas. A
obrigatória e significativa participação dos cidadãos e de associações representativas dos vários
segmentos da comunidade irá garantir o controle direto de suas
atividades e o pleno exercício da
cidadania. Se cada cidadão dedicar parte do tempo útil e de esforço leal ao "seu" Jardim Irene, aproveitando o exemplo de Cafu,
a cidade será melhor. Para todos.
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