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São Paulo, sábado, 06 de setembro de 2003

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ABUSO POLICIAL

Pedido foi encaminhado pela Polícia Civil, após o governo reconhecer que o comerciante Chan Kim Chang foi espancado no presídio

Justiça do Rio decreta a prisão de 6 agentes

FERNANDA DA ESCÓSSIA
FABIANA CIMIERI
DA SUCURSAL DO RIO

A Justiça do Rio decretou ontem à noite a prisão por 30 dias, prorrogáveis por mais 30, de seis agentes penitenciários suspeitos do espancamento do comerciante chinês naturalizado brasileiro Chan Kim Chang, que morreu na noite de quinta depois de ficar oito dias em coma. O pedido de prisão foi encaminhado pela Polícia Civil.
Só ontem, após a morte de Chan e de um laudo mostrando que ele sofreu traumatismo crânio-encefálico por ação contundente, o governo do Estado reconheceu que ele morreu após ser espancado no presídio Ary Franco. O pedido de prisão foi anunciado pelo delegado Marcelo Fernandes, que assumiu o caso ontem.
Chan foi preso no dia 25 de agosto por policiais federais quando tentava embarcar no Aeroporto Internacional Tom Jobim sem declarar US$ 30 mil à Receita Federal. Levado para o presídio Ary Franco (zona norte), centro de triagem de detentos, foi encontrado dois dias depois, desacordado e com lesões no corpo.
O governo estadual, que antes da morte de Chan falava tanto em espancamento como em autolesão, eliminou a segunda hipótese. "A minha determinação é que se puna, porque nós não vamos compactuar com tortura no nosso governo", afirmou a governadora Rosinha Matheus (PMDB).
O chefe de Polícia Civil, delegado Álvaro Lins, disse que o espancamento causou a morte de Chan. Segundo ele, a mudança de rumo na investigação se deveu ao resultado do laudo da necropsia, apontando como causa da morte traumatismo crânio-encefálico com hemorragia cerebral, provocada por ação contundente -segundo ele, incompatível com autolesão.
"Dificilmente uma pessoa se autolesionará a ponto de causar traumatismo craniano, o que nos leva a concluir que houve ação externa", afirmou Lins.
Para o legista Nelson Massini, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), o conjunto das lesões de Chan aponta para espancamento. "Ele tinha lesões no corpo todo, o que mostra que foi agredido por várias pessoas, e também lesões de defesa."

Homicídio qualificado
A partir de agora, o inquérito sobre o caso irá apurar se houve homicídio qualificado. A investigação inicial apurava apenas danos ao patrimônio público, por causa da semidestruição de uma sala do presídio, e depois lesão corporal seguida de morte.
Segundo o delegado Marcelo Fernandes, a opção pelo homicídio doloso se deve ao fato de que, como crime hediondo, ele permite a prisão provisória. Mas, disse, no decorrer das investigações poderá ser caracterizado também o crime de tortura.
Ontem, foi realizada uma perícia complementar nas salas do presídio por onde Chan passou, com um reagente que é capaz de mostrar manchas de sangue mesmo que tenham sido lavadas. O Disque-Denúncia recebeu cinco denúncias anônimas indicando que Chan foi espancado para que revelasse a senha do seu cartão.
Além do laudo da necropsia, outro exame feito quando Chan ainda vivia, a pedido do Ministério Público Federal, já indicava o espancamento. A divulgação desse laudo pelo secretário de Direitos Humanos, João Luiz Pinaud, horas antes da morte de Chan, havia sido criticada pelo secretário de Administração Penitenciária, Astério Pereira dos Santos.
Ontem, com a notícia da morte, a governadora se reuniu com Pinaud, Santos e o chefe de Polícia Civil. À noite, Santos afastou sete dos 12 agentes de plantão no dia em que Chan chegou ao Ary Franco. Santos ainda determinou a transferência de dois presos que teriam testemunhado o crime.
Os agentes que tiveram a prisão decretada são Ricardo Wagner Sarmento Alves, Ricardo Duarte Pires Valério, Carlos Alberto de Souza Rodrigues, Denis Gonçalves Monsores, Everson Azevedo da Motta e Raul Broglio Júnior.
Três deles -Monssores, Rodrigues e Motta- prestaram depoimento ontem na PF, que também investiga o caso. Eles reafirmaram o que todos os agentes haviam dito na Polícia Civil, de que Chan teve uma crise nervosa na sala de identificação e se autolesionou.


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