São Paulo, domingo, 06 de setembro de 2009

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Após confronto, Heliópolis pede tratamento melhor

Líderes da favela negam vínculo de protesto com o tráfico e reivindicam que o local seja tratado como parte da cidade

Para líder, manifestação pela morte de garota na semana passada, durante perseguição iniciada em São Caetano, foi motivada por "indignação"

Joel Silva/Folha Imagem
Crianças brincam de bola na área mais pobre da favela de Heliópolis,
na zona sul de São Paulo


LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

A jovem Ana Cristina Macedo, 17, nasceu em Crateús, no Ceará -como ela, 91% dos habitantes de Heliópolis nasceram no Nordeste ou são filhos de nordestinos. Era mãe de um bebê de apenas um ano e oito meses -crianças e jovens são 60% da população local.
A garota morreu ao retornar do primeiro dia de aula em uma escola estadual do bairro. Era evangélica, como muitos de Heliópolis. E frequentava a Imperador do Ipiranga, a escola de samba de Heliópolis.
Tantos pontos de contato com a maioria da população da maior favela de São Paulo (as estatísticas oscilam entre 85 mil e 125 mil, segundo a fonte), fizeram com que alguns dos líderes do lugar tenham-se sentido ofendidos quando se disse que o protesto pela morte de Ana Cristina havia sido organizado pelos traficantes do lugar.
"Não foi. Houve pessoas que pegaram carona na revolta legítima pela perda da nossa jovem? Houve. Mas foi a indignação que motivou o protesto", afirma Antonia Cleide Alves, nordestina, presidente da União de Núcleos, Associações e Sociedades de Moradores de Heliópolis e São João Clímaco.
Segundo ela, Heliópolis "exige" ser tratada como parte da cidade. "O que aconteceu aqui é que fomos invadidos pela violência que levou a vida da jovem Ana Cristina. Perseguidores e perseguidos não eram daqui." A presidente se refere ao fato de os perseguidos na noite da última segunda-feira serem acusados de roubar um veículo na vizinha São Caetano do Sul e de os perseguidores serem guardas-civis de São Caetano.
"Se o mesmo tivesse acontecido em qualquer bairro da cidade, seria um escândalo, mas, como é aqui, temos de repetir todo o tempo que nós é que fomos as vítimas", diz Antonia.
A megafavela encravada na fronteira entre São Paulo e São Caetano do Sul tem a mesma população que Atibaia (IBGE-2007). Mas, enquanto a cidade paulista espalha-se por 478 km2, a favela espreme-se em área menor do que 1 km2.
"Há uma divisão em Heliópolis que quem está fora nem imagina. Lá [refere-se ao núcleo mais organizado da favela], tem orquestra sinfônica, tem quadras de esportes, tem programas de profissionalização, tem lavanderia comunitária, tem artista de TV e o presidente Lula visitando. Aqui, não tem nada. Não tem creche. Não tem esgoto. Não tem espaço para as crianças brincarem." A frase é de Olivia Silva Soares, 48, diretora da Associação Unidos de Vila Carioca, o núcleo miserável da favela.
As estatísticas oficiais da prefeitura dizem que 62% das casas de Heliópolis têm esgoto. No núcleo miserável da favela, nenhuma tem. Pelas vielas estreitas e íngremes, em que um carro não consegue passar, pisa-se em água de banho, de lavagem de roupas, de descarga de privada.


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