São Paulo, segunda-feira, 06 de novembro de 2006

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MOACYR SCLIAR

Zoológicas


Até elefantas gostam de se olhar no espelho! E isso, segundo os cientistas, é prova de inteligência


 1. Onça
Uma fêmea de onça-parda invadiu um hospital em Naviraí (352 km de Campo Grande, MS). A onça, que estava escondida sob um balcão de atendimento, foi sedada por um veterinário. Após foi removida para uma clínica veterinária, onde exames mostraram que estava em perfeito estado de saúde. Cotidiano Online, 31 de outubro

"Senhor diretor: pelo presente, quero relatar um incidente ocorrido no hospital que V.S. dirige e que é uma prova do mau atendimento prestado às pessoas que, como eu, ali comparecem.
No último dia 30 lá fui eu para consultar. Não era nenhuma coisa grave, mas cuido de minha saúde e gosto de fazer revisões periódicas para saber se está tudo certo comigo. Dirigi-me à recepção, onde disseram que eu teria de aguardar.
Como o senhor está cansado de saber, esta é a regra: sempre tem de aguardar. Sempre tem fila. Sempre tem outros na frente. Mas isso até não me incomoda muito, já estou acostumada. Levo sempre comigo uma revista e fico lendo. E foi o que eu fiz: sentei na sala de espera e comecei a ler a minha revista. E aí aconteceu: de repente, surgiu do nada uma onça e simplesmente entrou no consultório.
Sim, eu imagino sua explicação: trata-se de animal feroz, incontrolável etc. Mas suspeito que não seja bem assim. Acho que se trata de uma onça domesticada e mais, que tem privilégios, tanto que um veterinário foi chamado logo em seguida.
Quer dizer: pessoas têm de esperar, onças não. Como se dizia antigamente, prezado diretor, o senhor é um legítimo amigo da onça. E é por isso que, na próxima consulta, vou botar meu charmoso vestido estilo oncinha. Talvez eu consiga então furar a fila."

2. Elefanta
 Os elefantes, assim como os grandes primatas, têm a capacidade de se reconhecer quando se olham no espelho, segundo pesquisadores americanos. Eles puseram três fêmeas do zoológico de Bronx (Nova York) em frente a um grande espelho. As elefantas observaram suas imagens e comprovaram sua identidade com movimentos corporais; até inspecionaram o interior da tromba. O estudo demonstra que os elefantes têm uma vida social complexa e um alto nível de inteligência. Ciência Online, 30 de outubro

"MEU CARO esposo: estou anexando a esta um recorte de jornal que me parece muito oportuno. Refere-se a elefantes (elefantas, melhor dizendo), mas tem muito a ver com nossa situação. Não é pouco o que temos brigado, como você muito bem sabe.
E temos brigado sobretudo por causa de sua irritação, de sua intolerância. Você me acusa de vaidosa, você diz que passo a vida na frente do espelho me olhando, apesar de (sempre segundo suas palavras) ser uma elefanta de tão gorda. Mais: você diz que pessoas que se olham demais no espelho não têm inteligência e que são incapazes de prestar atenção aos outros.
Durante muito tempo aceitei em silêncio suas acusações porque, de fato, não tinha argumentos para lhe responder. Agora, no entanto, a ciência veio em meu socorro.
Você vê, até elefantas gostam de se olhar no espelho! E isso, segundo os cientistas, é prova de inteligência e da capacidade para ter uma vida social complexa. E em busca de uma vida social complexa eu irei, caro esposo. Estou lhe deixando. Vou viver com um próspero empresário, gordo e vaidoso como eu. Ele ganha muito dinheiro fabricando espelhos.
Tenho certeza de que me compreenderá."


MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha


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