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ENSINO SUPERIOR
Ministro diz que privatizar instituições federais não é a saída e quer criar vagas públicas em universidades privadas
Para Tarso, é preciso definir verba antes da reforma
LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Responsável pela condução da
reforma universitária, o ministro
da Educação, Tarso Genro, 56,
considera uma "visão equivocada" o diagnóstico do Ministério
da Fazenda de que o financiamento de instituições federais é
uma forma de os mais ricos se
apropriarem de grande fatia dos
gastos públicos sociais.
Inspirado em análises do Banco
Mundial, o documento "Gasto
Social do Governo Central", divulgado pela Fazenda em novembro, diz que cerca de 46% dos recursos do governo para o ensino
superior beneficiam os 10% mais
ricos. Defende a expansão dos
empréstimos em cursos privados.
Para Tarso, os alunos das federais "são produto da estrutura
perversa e desigual" da sociedade.
Diz que a privatização não é o caminho para corrigir a diferença,
mas defende que haja vagas públicas em instituições privadas.
Advogado e ex-prefeito de Porto Alegre (RS), Tarso assumiu o
ministério na última semana com
a meta de finalizar a reforma universitária até o segundo semestre.
"O que adianta fazer uma proposta da mais bela reforma universitária do mundo sem dizer
como ela é financiada?", questiona ele, em entrevista à Folha.
Folha - Na academia há críticas ao
diagnóstico divulgado pela Fazenda. O sr. concorda com a posição do
documento?
Tarso Genro - Essa visão é rica e
ajuda na elaboração da reforma
universitária. Mas eu, particularmente, não concordo. O fato de a
universidade pública ter um conjunto de setores sociais de renda
mais elevada não depõe contra
ela. Depõe contra a estrutura de
classe da sociedade.
Os freqüentadores da universidade são produto dessa estrutura
perversa e desigual. Para corrigir
isso, não é privatizando a universidade. Trata-se de ter um processo de distribuição de renda que
consiga colocar as pessoas em situação equiparada para disputar
o ingresso na universidade.
Folha - O sr. diz que chegou a hora de projeto, não mais de argumentação. O que significa isso?
Tarso - Argumentação doutrinária é um momento necessário de
formação de qualquer juízo. Só
que já existe. Agora é hora de
transformar a doutrina em algo
concreto. O que adianta fazer
uma proposta da mais bela reforma universitária do mundo sem
dizer como ela é financiada? Parece-me que esse tipo de proposta
pode cair no vazio. Temos que estabelecer nexo entre elaboração
doutrinária, proposta teórica e capacidade de ser implementada.
Folha - Isso é uma crítica ao ex-ministro Cristovam Buarque?
Tarso - De maneira nenhuma. O
primeiro ano de governo necessariamente tinha que ser de expansão da discussão teórica, doutrinária e da superposição de idéias,
o que o Cristovam fez com propriedade. Eu faria o mesmo.
Folha - O sr. é a favor da cobrança
de ex-alunos para financiar universidade pública?
Tarso - Tenho dúvidas se isso resiste à análise do Supremo Tribunal Federal. De outra parte me
pergunto se é justo um grupo restrito sustentar a universidade pública, que na verdade presta serviço e é fundamental para toda a sociedade. Isso quer dizer que devemos buscar outras formas de financiamento.
Folha - O sr. vai reformular o investimento nas federais?
Tarso - Neste ano vamos cumprir rigorosamente o Orçamento
e verificar com a Fazenda a melhor forma para cumpri-lo.
Folha - E para as particulares, haverá financiamento?
Tarso - Nossa visão é criar vagas
públicas em universidades privadas. É absolutamente inadmissível que tenhamos 37% das vagas
não-ocupadas em instituições
privadas. Temos uma pista de como fazer. Em dez a 15 dias teremos a proposta formatada.
Folha - Haverá aumento da fiscalização das filantrópicas?
Tarso - Tem que aumentar. Buscaremos todos os meios para reduzir ao máximo as instituições
caça-níqueis, que, na verdade, são
grupos empresariais disfarçados e
prestam ensino desqualificado.
Folha - O sr. modificará o sistema
de avaliação do ensino superior,
que está no Congresso?
Tarso - O projeto de conversão
está sendo negociado. Adotamos
o critério de dar mais objetividade
à aferição, sem que recaia exclusivamente sobre o aluno e, ao mesmo tempo, reduza o poder de arbítrio do administrador.
Folha - Como serão os critérios?
Tarso - O Provão passa a ter outro caráter. Tem que ser feito por
amostragem, usando metodologia científica.
Folha - O vestibular mudará?
Tarso - Imagino um sistema que
a médio e longo prazo acabe com
o vestibular. Mas acho que a extinção imediata gera injustiça.
Folha - E as cotas para negros?
Tarso - A política de cotas é justa
e deve ser implementada, mas é
também só o ponto de partida.
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