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São Paulo, sábado, 07 de junho de 2003

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LETRAS JURÍDICAS

Empresários e empresas no Código Civil

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

A tendência normal, decorrente do uso, liga a palavra empresário a pessoa em boa situação econômica, que atua no comando de empresa. Deveremos ter mais cuidado com essa acepção a partir do artigo 966 do novo Código Civil, onde se encontra a definição: empresário é a pessoa física que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção de bens ou serviços ou para sua circulação. Nessa definição cabem tanto o presidente da Fiesp como o pequeno lojista, com seu comércio de bairro. Isso é bom para a cidadania?
Não adianta o leitor me transferir a pergunta, mas proponho que pensemos juntos sobre o assunto, fazendo a avaliação de outros dispositivos do título do código dedicados à empresa. O artigo 967 exige a inscrição pessoal do empresário na Junta Comercial. Ele tem o dever de requerer a inscrição, independentemente do registro da empresa, sem levar em conta se se trata do pequeno comércio ou da grande corporação industrial.
Vamos focalizar, entre tantos exemplos igualmente expressivos, a sociedade comercial dedicada à venda de hortaliças e frutas (a quitanda). Não deveria estar sujeita a tais obrigações, com as despesas correspondentes. Há uma ressalva útil no artigo 970 do código. Diz que a lei (lei futura, a ser votada, aprovada e publicada) garantirá tratamento mais favorecido e simplificado ao empresário rural e ao pequeno empresário quanto à inscrição e aos efeitos decorrentes. Isto é, a inscrição é mantida, mas deve ser mais barata, mais simples e assim por diante, o que ficará na dependência da lei futura.
Exceção a ser lembrada, está excluída da condição de empresário e, portanto, não está sujeita ao registro a pessoa que exerce profissão intelectual de natureza científica, literária ou artística. Só a experiência distinguirá as profissões enquadradas nessa exceção. Uma estilista como fica? O dono da galeria de arte o que é? Nesse caso, parece razoável que o(a) estilista nunca será empresário(a), salvo se o exercício profissional constituir elemento da empresa (artigo 966, parágrafo único), próprio da criação de modelos para consumo de massa.
Um tipo de sociedade, mesmo com finalidade mercantil, distingue-se das outras: é a sociedade simples. Tem definição própria no Código Civil (artigo 997), mas não é registrada na Junta Comercial, e sim no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, que é um setor do Cartório de Registro de Títulos e Documentos. O mesmo acontecerá em todas as modificações pelas quais passarem, resolvidas pelos sócios em decisão unânime. A sociedade é simples, mas tem necessariamente capital expresso em reais, dividido em cotas e mecanismos próprios, previstos no contrato, de distribuição de lucros e perdas. A inscrição da sociedade simples não é compatível com o registro do seu titular na Junta Comercial. O código não deixa clara a matéria ante a obrigatoriedade imposta pelo artigo 967. A melhor orientação é a de que, nesse caso, valerá exclusivamente o assentamento no registro civil, sendo o dos sócios simultâneo com o registro da sociedade.
Ao tratar de associações (que não podem ter finalidade econômica) e de empresas para as quais a atividade econômica é objetivo essencial, a redação do Código Civil também complicou a tomada de decisões, sem benefício para o bem-estar geral. Há outras confusões em matéria associativa e societária, mas, como diz Miguel Reale, será bom esperar algum tempo antes de emendarmos o código. A prática pode indicar rumos melhores.


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