São Paulo, segunda, 7 de julho de 1997.



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ARTIGO
Avaliando o Exame

Nacional de Cursos

MESSIAS COSTA


O Exame Nacional de Cursos é uma experiência inovadora e louvável dentro da educação brasileira. Toda atividade humana precisa ser avaliada, e a educação superior, pela importância que apresenta para o futuro do país e pelo total de recursos (públicos e privados) que envolve, não pode deixar de prestar contas à sociedade sobre suas qualidades e defeitos. No entanto, é de supor que tal iniciativa também deva ser avaliada.
A primeira observação diz respeito ao marketing do exame, que, logo no início, ganhou o apelido, até certo ponto depreciativo, de "provão". Nesse particular, ao que parece, houve um certo descuido dos organizadores do evento. A falha maior foi a de deixar de enfatizar, desde o começo, o aspecto avaliativo de tão importante iniciativa.
Há estudantes que se sentem mal só de pensar que terão que se submeter a um teste. Em vez de Exame Nacional de Cursos, talvez tivesse sido melhor escolher um nome como Avaliação Nacional de Cursos para a Melhoria do Ensino Superior, ou coisa semelhante.
Outra consideração que precisa ser feita -mais importante- diz respeito à interpretação dos resultados divulgados.
O estudante -elemento por meio do qual é feita a avaliação das faculdades e dos cursos- é ao mesmo tempo insumo e produto dentro desse processo de avaliação. Os resultados divulgados pela imprensa só consideram o aluno-produto, não levando em conta o aluno-insumo. Dessa forma, o resultado de uma dada escola que tenha se saído bem nos exames é altamente explicável pela já "boa" qualidade do aluno quando de seu ingresso por meio do vestibular.
Por essa razão, uma avaliação mais justa e correta dos cursos e das faculdades por exames aplicados nos alunos precisaria estabelecer um "controle estatístico" da influência do potencial inicial do aluno sobre o resultado final, como o do provão.
Esse potencial deveria ainda ser medido por um mesmo instrumento administrado por ocasião do vestibular ou de algum outro exame aplicado no primeiro ano da faculdade. Ou seja, a nota obtida em um exame de saída (tipo provão) precisaria ser "corrigida" pela nota alcançada em algum exame de entrada.
Sem essa providência, a comparabilidade dos resultados do Exame Nacional de Cursos fica falha, uma vez que, da forma como ela tem sido feita, parte-se do pressuposto de que os alunos eram todos iguais no início dos seus cursos superiores. E esse pressuposto é indiscutivelmente falso.
Em resumo, é preciso muita cautela na avaliação dos cursos e faculdades por meio das notas obtidas pelos estudantes. Não se pretende, com isso, tirar o mérito das faculdades que obtiveram bons resultados no Exame Nacional de Cursos nem justificar a baixa realização das demais. Os resultados obtidos são importantes como diagnóstico da situação do ensino superior, mas não são suficientes para mostrar qual é a melhor ou a pior escola superior.
A advertência é tão-somente destinada a chamar a atenção de todos para a relatividade dos números e, consequentemente, para o cuidado que se deve ter com a interpretação apressada dos resultados publicados.


Messias Costa, 53, é doutor pela Universidade de Stanford (EUA) e professor-adjunto na Universidade de Brasília.



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