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Diretor admite que segurança é precária
Mário de Andrade não tem câmera de vídeo; fragilidade de instituição estimula formação de quadrilhas, diz Carvalho Filho
Para ele, patrimônio artístico precisa de polícia especializada no setor e investimento em proteção; local tem 25 bibliotecários
DA REPORTAGEM LOCAL
Não há câmeras de vídeo no
setor de obras raras da Mário
de Andrade. Quem entra na biblioteca não é fotografado por
câmeras digitais, como acontece na mais humilde das empresas. O advogado Luís Francisco
Carvalho Filho não tem dúvidas de que a biblioteca que dirige tem uma segurança "precária": "A biblioteca tem uma fragilidade que é evidente".
Essa fragilidade, na interpretação dele, estimulou a formação de quadrilhas. Não é circunstancial, segundo ele, que a
Mário de Andrade integre uma
lista de instituições culturais
furtadas que só cresce e da qual
fazem parte a Biblioteca Nacional do Rio, o Arquivo Histórico
da cidade do Rio de Janeiro, a
Chácara do Céu, também no
Rio, o Itamaraty, em Brasília, e
o Museu do Ipiranga, em São
Paulo.
A Mário de Andrade toma
uma série de precauções com
suas obras raras. Qualquer pessoa pode requisitar obras da coleção, que tem gravuras do livro
"Jazz" de Matisse a Bíblias impressas antes de 1500, chamadas incunábulos.
O pesquisador nunca entra
na sala em que as obras raras
são guardadas. Ele fica numa
sala de leitura própria para
obras raras, sempre na companhia de um funcionário da biblioteca. Se há uma versão mais
recente do livro raro, a mais antiga não sai da sala. Essas precauções foram suficientes por
mais de 80 anos -a biblioteca
foi fundada em 1925-, mas não
resistiu ao que parece ser um
ataque em série.
Debret não dá no pomar.
Carvalho Filho diz que há pelo menos duas providências a
serem tomadas pelos governos:
1) "É o momento de o poder público fazer um investimento
concreto e real, criando delegacias especializadas na defesa do
patrimônio artístico. O Brasil
precisa de polícia especializada
nesse setor".
2) Instituições culturais precisam investir em segurança.
A especialização da polícia,
para Carvalho Filho, coibiria o
mercado que existe no Brasil de
obras furtadas. "Existe uma espécie de tolerância social e moral a essas coleções que se fundam nisso [no furto]. Esse mercado tem de ser combatido com
rigor pelo poder público."
Para o diretor da Mário de
Andrade, os compradores de
obras que não se preocupam
com a origem delas sabem que
"Debret não nasce em pomar"
-ou seja, se não tem origem definida, é provável que tenha sido furtado.
O delegado Mário Jordão Toledo Leme, da 1ª Delegacia Seccional de São Paulo, diz que não
descarta nenhuma hipótese.
"Pode ser uma encomenda de
um colecionador e pode ser um
furto isolado. É uma investigação demorada e complexa porque a pessoa que compra a gravura não expõe a obra."
Recuperação ameaçada
O furto ocorreu num momento em que a Mário de Andrade promove uma licitação
de R$ 16 milhões, financiados
parcialmente pelo BID (Banco
Interamericano de Desenvolvimento), para recuperar o prédio e modernizar seus serviços.
A previsão é que as obras comecem em novembro.
"Esse episódio ameaça o processo de recuperação da biblioteca porque mina nossa credibilidade. A credibilidade da instituição já estava bastante abalada por causa da falta de investimentos", afirma o diretor.
As obras, previstas inicialmente para começar neste mês,
podem ter estimulado a quadrilha a agir, de acordo com Carvalho Filho. A eventual quadrilha
pode ter aproveitado a sobrecarga de trabalho que acompanha a preparação para o restauro do prédio para praticar os
furtos.
Três forças-tarefas atuam na
Mário de Andrade para preparar o prédio para o restauro:
1) Os 300 mil livros estão
sendo limpos e higienizados,
para eventual restauro ou tratamento;
2) O catálogo eletrônico está
em fase de produção; e
3) A coleção de jornais passa
por um processo de embalagem
porque será retirada da torre da
biblioteca e realocada num prédio ao lado.
O número de funcionários da
biblioteca para todos esses processos é "pequeno", ainda segundo o diretor. Ele cita o número de bibliotecários para
ilustrar a precariedade. Em
1992, eram 66; hoje são 25.
(MARIO CESAR CARVALHO E RICARDO
GALLO)
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