São Paulo, domingo, 07 de setembro de 2008

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Governo pune fumante e limita tratamento

Rede pública de saúde não oferece amplo atendimento para quem deseja parar de fumar; fila de espera supera um ano

SP gastou em 2007 mais de R$ 92 milhões com pacientes tratados de doenças causadas pelo fumo e R$ 3,2 milhões em campanhas e tratamentos

ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Os governos federal, estadual e municipal criam uma série de leis para restrição ao tabagismo, mas não oferecem atendimento amplo na rede pública para quem tenta encontrar ajuda para abandonar o vício.
No Estado de São Paulo, por exemplo, onde há duas leis estaduais aprovadas e outras duas em tramitação, apenas 50 municípios (dos 645 existentes) possuem equipes credenciadas para atender um público estimado de 6 milhões de fumantes. A população total estimada é de 41.687.652.
O Ministério da Saúde não informou quantos municípios no país possuem equipes.
Essa falta de estrutura provoca filas superiores a um ano de espera, até mesmo para quem necessita urgentemente de tratamento.
"Quando fumo, eu chego a chorar de medo morrer", disse a ex-copeira Odete Sinquevi de Lima, 60, vítima de um infarto, e que há mais de um ano integra a lista de espera do Incor (Instituto do Coração).

Dificuldade
Repórter da Folha tentou, como fumante, participar de pelo menos um programa na rede pública de saúde. Conseguiu conselhos padronizados, informações erradas e ingressar numa fila sem previsão de atendimento.
"Você ainda conseguiu entrar numa fila. Muitos nem isso conseguem", disse a psiquiatra Célia Costa, do grupo de Apoio ao Tabagista do Hospital A.C. Camargo (Hospital do Câncer). Estudo feito por ela com 6.000 fumantes em tratamento aponta que cerca de 50% precisam de remédio. Todos precisam, porém, de acompanhamento profissional.
"Não dá para a gente achar que é só chegar e passar uma receita. O que muitas vezes acontece. "Toma esse remédio aqui e boa sorte". Não adianta nada", afirma.
Segundo médicos ouvidos pela reportagem estudos apontam que apenas 5% das pessoas que tentam parar de fumar sozinhas conseguem abandonar o tabagismo. Com ajuda profissional especializada (e remédio) esse número chega a 45% em pacientes problemáticos.
"Eu havia tentado duas ou três vezes sozinho. Conseguia ficar máximo dez dias. Não agüentava e voltava", diz o advogado Gino Caracciolo, 41, que fumou durante 20 anos. Está há mais de dois anos sem fumar após participar de programa no Cratod (Centro de Referência em Álcool, Tabaco e Outras Drogas) da Secretaria de Estado da Saúde paulista.
A cardiologista Jaqueline Issa, coordenadora do Ambulatório de Tratamento do Tabagismo do InCor, que atende cerca de 200 pessoas ano pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e tem fila de espera de 14 meses, disse que queria, mas não pode aumentar as vagas, porque o remédio enviado pelo governo federal não é suficiente nem para o número atual.
"A distribuição é errática. As gomas (de nicotina) não recebemos há mais de um ano. Bupropiona (antidepressivo) ficamos 6 meses sem receber", diz.
A diretora do Cratod, Luizemir Wolney Lago, também aponta a falta de remédios para o número reduzido de vagas. Diz também que outro problema encontrado é a falta de comprometimento de parte dos profissionais em obedecer às exigências legais e, dessa forma, conseguir credenciamento para atender. "Como eu vou tratar alguém no ambiente com todo mundo fumando? Não pode", afirmou.
Em 2007, de acordo com levantamento feito pela Secretaria de Estado da Saúde, os pacientes tratados de doenças provocadas pelo cigarro custaram à rede de saúde mais de R$ 92 milhões. O Estado investe em média, segundo a pasta, cerca de R$ 3,2 milhões em campanhas e na manutenção de seu centro de apoio ao fumante, o Cratod.
No país, são pelo menos R$ 338,6 milhões por ano gastos no SUS, segundo cálculos da economista Márcia Pinto, da Fundação Oswaldo Cruz.
Entre as leis tramitando em São Paulo está a do governador José Serra (PSDB), enviada à Assembléia Legislativa no final do mês passado, que busca proibir o uso do cigarro em ambientes coletivos fechados -entre públicos e privados. O Estado não prevê, segundo o governador, criar mais programas contra o tabagismo.


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