São Paulo, quinta-feira, 08 de março de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VIOLÊNCIA

Para evitar sua transferência, detento coloca fogo em colchão dentro da cela, ocupada por outras sete pessoas

Protesto de preso provoca 2 mortes no Rio

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Fachada da penitenciária Carlos Tinoco, no município de Campos, no Rio, onde duas pessoas foram mortas e seis ficam feridas


DA ENVIADA ESPECIAL A CAMPOS

Um incêndio iniciado pelo preso Francisco dos Santos Martins, que se rebelou contra sua transferência para o Rio de Janeiro, gerou dois mortos e seis feridos na penitenciária Carlos Tinoco, em Campos, norte fluminense.
O presídio vivia um clima tenso desde a segunda-feira, quando um grupo de internos realizou um protesto durante o café da manhã contra a falta de assistência jurídica e a superlotação do local, que tem capacidade para 360 pessoas e abrigava 382 presos.
Segundo o direção da penitenciária, essa manifestação foi organizada por Francisco Acioli, ligado à facção criminosa Comando Vermelho, que cumpria pena de cinco anos na penitenciária por assalto à mão armada.
Ele teria orientado outros detentos a não voltarem para as celas e a permanecerem no pátio até que houvesse negociação com a diretora do Carlos Tinoco, Maria José Porto.
Os presos pediram a presença de um médico, um psicólogo e um advogado para atendê-los, e exigiram a transferência de 22 internos para presídios do Rio. A diretora atendeu os presos, juntamente com o prefeito da cidade, Arnaldo Vianna (PSB), que se comprometeu a atender os pedidos. A transferência foi marcada para ontem.
Por volta das 9h de ontem, dois defensores públicos foram para a penitenciária para organizar a transferência. De acordo com a diretora, o detento Francisco dos Santos Martins, 23, iniciou a confusão, recusando-se a ser transferido. Martins cumpria pena de 12 anos de detenção pelo assassinato do jornalista José Carlos Pereira Campos, colunista do jornal "Folha da Manhã", no ano passado.
""Ele falou que não queria sair daqui e, num momento de desespero, ateou fogo ao colchão da cela, onde estavam outros sete presos", contou Maria José.
As chamas se espalharam rapidamente e tomaram conta da cela. Carlos Fernandes Gonçalves e Paulo Giácomo Nicreciano morreram queimados.
Martins, Nélson Glória da Silva Júnior, 36, Ezequiel Rangel, 22, que trabalhava na enfermaria da unidade e tentou socorrer os presos, Carlos Alberto de Oliveira, 40, Marco Antônio Barroso Alves, 30, e Luis Henrique Lopes Gomes sofreram queimadas de diferentes graus. Wilson André Júnior, 39, ficou intoxicado com a fumaça. Todos foram levados para o hospital Ferreira Machado.
Martins, com 40% do corpo queimado, foi transferido para o hospital Souza Aguiar, no Rio. Segundo os médicos, seu estado é estável. Nélson, Ezequiel, Carlos e Luis Henrique sofreram apenas queimaduras leves e receberam alta logo depois. Marco Antônio, que teve 25% do corpo queimado, deverá permanecer internado por pelo menos mais uma semana.
Logo após o incidente, os presos tiveram suas celas trancadas e a transferência foi temporariamente cancelada. Eles jogaram um colchão em chamas no pátio do presídio, penduraram roupas pretas nas janelas, em luto pelos mortos, recusaram-se a comer e forçaram as grades das celas.
Mais de 50 policiais militares foram para o local e contiveram o tumulto cerca de duas horas depois. A penitenciária foi revistada e nenhuma arma foi encontrada.
Apesar da transferência ter sido cancelada, Acioli, que correria risco de vida se permanecesse no local, foi levado para o presídio Ari Franco, no Rio. Além dele, outros detentos que cumprem pena na penitenciária pertencem a facções criminosas como Comando Vermelho e Terceiro Comando.
O Desipe (Departamento Estadual do Sistema Penitenciário) abriu uma sindicância interna para apurar o caso e afastou temporariamente a diretora da unidade.
A falta de assistência jurídica reivindicada pelos presos, foi confirmada pelo secretário de Justiça do Estado, João Luiz Duboc Pinaud. Ela foi suspensa em dezembro do ano passado, pois o advogado que atendia os presos era suspeito de estar recebendo dinheiro de um deles.



Texto Anterior: Pastoral da Criança: Zilda Arns quer que mulher "arregace as mangas"
Próximo Texto: Não houve motim, diz secretário da Segurança
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.