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"Poderia ter evitado a morte", diz A.L.X.
DA REPORTAGEM LOCAL
O comparsa afirma que quer
matar a vítima do assalto e pergunta se pode. A.L.X., então com
14 anos, balança os ombros e diz
"normal, normal". A palavra é entendida pelo comparsa como
uma autorização. O homem dono
do carro é morto com dois tiros.
A cena é lembrada pelo próprio
jovem A.L.X., interno da Febem
há dois anos e três meses. Mas
agora, na fala do próprio adolescente, ganhou tom de indignação.
"Não sei como pude falar aquilo.
Se eu quisesse, poderia ter evitado
a morte", admite.
Há seis meses na unidade 19 do
complexo Tatuapé, A.L.X. diz que
agora tem consciência da indiferença com que tratou a vida de
uma pessoa. "Poderia ser alguém
da minha família. Poderia ser eu
mesmo", diz o jovem.
A.L.X. diz que é responsável,
mesmo não tendo feito os disparos. Nas sessões com o grupo de
psicólogos, afirma ter se conscientizado disso. "Antes falava
que a culpa era do outro. Agora
sei que o que fiz foi muito grave."
E ele não é exceção. Como A.L.X.,
outros internos ouvidos pela reportagem também assumiram o
erro e alguns descobriram por
que agiam dessa forma.
R.P.C., 18, matou outro jovem
com uma facada. A morte foi o resultado de uma vida conturbada
por brigas constantes na rua. "Eu
era nervoso, brigava com todo
mundo", afirma.
Na Febem, diz ter entendido
que a causa de seu comportamento era mais antiga. Ele foi abandonado pela mãe e nunca conheceu
o pai. Também se sentia inferior
às duas filhas que sua mãe teve depois, as quais ela não abandonou.
Só depois de internado na Febem, R.P.C. chamou a mãe e teve
coragem de perguntar por que fora abandonado. A mãe disse que
não tinha condições de criá-lo e o
entregou para a avó do garoto.
Ela, que mal falava com o filho,
viaja 174 km de Mococa para São
Paulo todos os finais de semana
para visitá-lo. "Estou mais tranqüilo. Não quero mais brigar com
ninguém", diz R.P.C., outro participante do programa.
E não só internos admitem suas
culpas e medos. O coordenador
de equipe Arnaldo Sebastião da
Silva, 33, reconhece que teve medo quando foi se transferir do serviço burocrático para o contato
direto com os internos.
"Senti medo das rebeliões, de
ser agredido, de ser jogado de cima do telhado. Ficava à distância
[dos internos]", diz Silva. O tempo passou e ele afirma ter percebido que o medo era infundado.
Hoje, é referência entre os jovens.
Quando o professor Carlos Roberto Prado chegou à unidade,
Silva diz que também ficou receoso "porque poderia influenciar na
dinâmica da casa e no comportamento dos garotos". Agora, é um
dos maiores incentivadores do
serviço. "Os garotos estão mais
calmos e a relação melhorou."
O interno A.L.S., 17, concorda
com ele. "Agora a gente conversa,
brinca [com os funcionários]."
(GP)
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