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SEGURANÇA
Grupo de elite ocupa uma das favelas mais conhecidas do Rio; cinco dias após ocupação, nenhuma arma foi achada
Exército usa tropa do Haiti na Mangueira
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO
Além de um tanque de guerra e
de carros de combate, o Exército
enviou ao morro da Mangueira
(zona norte) 150 militares que até
dezembro integravam a tropa
brasileira em missão no Haiti,
país caribenho em guerra civil. É
um grupo de elite, treinado para
situações de conflito em áreas semelhantes às favelas cariocas.
Na madrugada, ouviram-se tiros na favela por pelo menos duas
vezes. Sobre o viaduto em frente à
Mangueira, o tanque ficou o dia
todo com a mira do canhão dirigida à vertente do morro voltada
para o estádio do Maracanã.
Os carros de combate Urutus
(veículo blindado de cerca de 15
toneladas, armado com metralhadora)-com cerca de dez homens
com fuzis, pistolas e facas- tinham objetivo intimidatório. Eles
circularam pela favela de manhã e
à tarde. A Mangueira é um morro
urbanizado, com ruas asfaltadas
até o topo. Temerosos, os moradores evitavam sair de suas casas.
Em busca de dez fuzis e de uma
pistola roubados na sexta-feira do
quartel do Estabelecimento Central de Transporte (São Cristóvão), o Exército montou uma
operação de grande porte para
ocupar a Mangueira.
Anteontem, foram deslocados
para a favela 500 militares, 250 deles do 57º Batalhão Escola de Infantaria Motorizada, tropa empregada no terceiro contingente
de militares brasileiros no Haiti,
de junho a dezembro de 2005.
A Mangueira é considerada
uma das mais perigosas favelas
cariocas. Nela, o tráfico de drogas
é controlado pela facção criminosa CV (Comando Vermelho). É
também uma das favelas mais conhecidas do país, por causa de sua
tradicional escola de samba.
A fim de evitar problemas em
um morro simultaneamente violento e glamouroso, o Exército
enviou à Mangueira uma equipe
experiente, o que não ocorreu em
outras das oito favelas ocupadas.
Do pessoal do 57º Batalhão que
esteve no Haiti, 150 foram selecionados para a tarefa. O comando é
do tenente-coronel André Novaes, que também chefiou tropas
no Haiti. No Telégrafo (parte alta
da Mangueira), ontem de manhã,
Novaes disse que não poderia dar
entrevistas. Afirmou que a situação estava sob controle e nada
disse sobre os tiros. Já o porta-voz
do CML (Comando Militar do
Leste), coronel Fernando Lemos,
disse que os disparos foram feitos
a esmo por traficantes. "Foram tiros de inquietação. Eles não atiraram nos militares."
A Folha apurou que o foco da
ação militar é pressionar os traficantes pelo prejuízo. Sufocados
em seus negócios, eles poderiam
fazer chegar às autoridades informações que levem às armas roubadas do quartel militar.
Trabalham em conjunto os serviços de inteligência do Exército,
da Marinha, da Aeronáutica e das
Polícias Federal e Civil do Rio de
Janeiro. No entanto, a estratégia
ainda não surtiu efeito.
Além da Mangueira, estão ocupadas as favelas do Jacarezinho,
Manguinhos, Dendê, Nova Brasília, Vila dos Pinheiros, Jardim
América e Parque Alegria, todas
na zona norte, e o morro da Providência (centro), onde, anteontem, foi morto a tiros o estudante
Eduardo dos Santos, 16.
A ação iniciada na noite de sexta
tem como único objetivo recuperar as armas roubadas, informa o
CML. Não visa combater o tráfico
ou combater a criminalidade.
Achadas as armas, os 1.200 militares, além dos 300 incumbidos
do planejamento e da parte administrativa da operação, voltarão
aos quartéis, diz o porta-voz do
CML. Lemos afirma que, se as armas não aparecerem, a ocupação
continuará. "O Exército só deixará as comunidades quando as armas forem achadas." E outras favelas poderão ser invadidas.
Base legal
O roubo do armamento aconteceu na madrugada de sexta-feira.
Horas depois, o CML abriu um
IPM (Inquérito Policial Militar)
para tentar identificar os criminosos e recuperar os fuzis e a pistola.
O IPM é previsto pelo Código de
Processo Penal Militar no caso de
crime cometido por militar. O
IPM também é aberto se um civil
pratica um crime em área militar
ou com um militar. Nos dois casos, os envolvidos são julgados
pela Justiça Militar Federal.
A ação nas favelas faz parte do
IPM, cujo regulamentação prevê
a busca externa de objetos roubados ou furtados de unidades militares. Para entrar nas casas, os militares devem ter mandados judiciais de busca e apreensão. Apenas as casas suspeitas estariam
sendo vasculhadas -com ordem
judicial-, segundo o Exército.
Além de patrulhar os acessos à
favela, os militares vistoriam carros, revistam pessoas e, eventualmente, detêm suspeitos.
Foi o que aconteceu ontem no
Jacarezinho. Um rapaz foi detido
com crack, segundo os militares.
Em nota, o CML declarou que a
ocupação "está sendo cumprida
com absoluta observação dos direitos humanos". Segundo a nota,
não há, até o momento, "nenhum
registro de incidente com a população civil das áreas envolvidas na
operação, sendo este um dos objetivos primordiais da força-tarefa", constituída pelo Exército e
pela Secretaria da Segurança do
Estado do Rio.
Sobre a morte do estudante
Eduardo dos Santos, 16, baleado
anteontem, a nota limita-se a informar que o caso é investigado
pela Polícia Civil.
Colaborou a Sucursal de Brasília
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