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DORMINDO COM O INIMIGO
Justiça faz mapa da contaminação nas delegacias paulistanas e acha de sarna a tuberculose
Preso divide cela com doenças contagiosas
MARCELO GODOY
da Reportagem Local
Os presos de São Paulo estão dividindo as celas superlotadas dos
distritos policiais da cidade com
doenças infecto-contagiosas como a Aids, a hepatite, a sífilis e até
mesmo a tuberculose.
Um levantamento inédito do Dipo (Departamento de Inquéritos
Policiais) do TJ-SP (Tribunal de
Justiça de São Paulo) e da Polícia
Civil constatou a existência de 56
presos com tuberculose diagnosticada e 80 com exame de HIV -vírus causador da Aids- positivo.
Ao todo foram informados pelas
delegacias, que mantêm cerca de
10 mil presos, 178 casos de doenças infecto-contagiosas, 22 casos
de doenças mentais e outros nove
presos com problemas gravíssimos de saúde, como leucemia.
Médicos, policiais e presos são
unânimes em afirmar que o número de doentes, principalmente
os tuberculosos, é bem maior.
"É uma situação trágica", diz o
diretor-geral do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, Guido Carlos Levy. Essa é a mesma opinião
do médico Dráusio Varela, autor
de estudos sobre contaminação
pelo vírus HIV, na Casa de Detenção de São Paulo.
"A Aids fez renascer a tuberculose. Ela não passa no contato casual, mas a tuberculose passa e está cada vez mais resistente aos medicamentos. Familiares e policiais
têm contato com detentos. Alguns
presos fogem. Assim, a tuberculose é um problema que atingirá a
população de modo geral. Isso já
aconteceu em Nova York."
Para Varela, os 56 casos de tuberculose confirmados pelo levantamento feito nas delegacias
representam só uma pequena parte do problema. "Devem ser os
casos em que o sujeito já está cuspindo sangue. Se você passa tuberculose em casa para seus filhos,
imagine em uma cela superlotada
e sem ventilação", diz.
A suspeita do médico pode ser
confirmada por casos como o do
preso Luciano Gonçalves da Silva,
30, condenado por roubo. Ele diz
que está com tuberculose, o que é
confirmado pelos policiais do 7º
DP. Mas seu nome não consta da
lista dos 56 tuberculosos.
"Estamos com muitos casos de
pneumonia, bronquite e outros
problemas respiratórios", diz o
delegado Carmo Aparecido Camargo, do 2º DP, no Bom Retiro
(região central).
No 7º DP, na Lapa (zona noroeste), o delegado titular, Douglas
Aparecido Randmer da Silveira,
enfrenta um surto de sarna e casos
de HIV positivo com a ajuda de
médicos da prefeitura. "Eles vieram e explicaram aos presos e familiares como combater a sarna."
Quase todo dia, uma equipe de
investigadores da delegacia leva
presos ao pronto-socorro do bairro ou ao Hospital Penitenciário.
"Nós os recebemos de volta após
uma melhora", disse Silveira.
Para tratá-los, comerciantes ajudam o 7º DP a comprar remédios.
"A gente se vira atrás de médico e
remédio, mas não combatemos a
Aids, só as infecções causadas pela
doença", diz Silveira.
Nas delegacias, existem também
casos de carcereiros que apanharam doenças, como sarna, micoses e conjuntivite, dos presos.
O levantamento dos doentes foi
concluído há 20 dias. Desde então,
um preso com HIV positivo morreu, outro fugiu e uma mulher
anêmica com pneumonia, bronquite e grávida foi solta. "É uma
batalha perdida", conclui Varela.
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