São Paulo, terça-feira, 08 de agosto de 2000


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TRAGÉDIA NORDESTINA
Objetivo de políticos alagoanos era obter maior volume de recursos federais, segundo comissão
Prefeitos aumentam mortos pela chuva

Alcione Ferreira/'Diário de Pernambuco'
Moradora de Belém de Maria, cidade da Zona da Mata pernambucana, entre casas destruídas pelas chuvas que castigaram o Estado


ARI CIPOLA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MACEIÓ

Prefeitos de 2 dos 34 municípios atingidos pelas chuvas da semana passada, em Alagoas, aumentaram o número de mortos em suas cidades. O objetivo, segundo a Comissão de Defesa Civil do Estado, era conseguir maior volume de recursos federais durante a reconstrução das cidades.
Com isso, o número oficial de mortos no Estado, que era 37 no sábado, passou para 22 ontem. As 15 mortes inexistentes foram verificadas pela comissão em Matriz de Camaragibe (dez a mais) e São Luís do Quitunde (foram anunciadas cinco mortes, mas nenhuma foi registrada). Os desabrigados continuam sendo 90 mil.
A justificativa dos prefeitos de Matriz de Camaragibe, Cícero Cavalcante (PMDB), e de São Luís do Quitunde, Jorge Cordeiro (PMDB), para a comissão foi a de que haviam contado como mortos pessoas desaparecidas.
"As pessoas apareceram depois de três dias de sumidas. Estão querendo me prejudicar porque o governo federal não tem ajudado em nada meu município", disse Cavalcante à Agência Folha. Cordeiro não foi localizado ontem.
Diante da diferença de números, o governo de Alagoas deixou de divulgar na tarde de ontem novos boletins com números da tragédia. A comissão admite até que haja entre os 22 mortos outras pessoas vivas. Os números finais só serão divulgados amanhã.
O presidente da comissão, coronel Antônio Campos de Almeida, disse que a Defesa Civil divulgou à imprensa dados repassados pelos prefeitos antes mesmo de fazer o trabalho de conferência, que já foi iniciado na sexta-feira.
Ao não checar os dados dos municípios, a comissão não cumpriu a resolução número 3 do Conselho Nacional de Defesa Civil, de 2 de julho de 99, que determina que o prefeito de cidades abaladas por tragédias façam um relatório preliminar que deve ser verificado pela comissão.
"Não fizemos a verificação porque temos municípios que ainda estão ilhados. Não acreditávamos na má-fé de algumas pessoas. Os prefeitos acharam que ganhariam mais dinheiro federal aumentando o número de mortos, de casas demolidas e de estradas danificadas", disse o coronel Almeida.
Ele afirma que a União não será lesada devido aos erros dos prefeitos. Segundo ele, uma comissão de técnicos da Sudene e do governo do Estado está fazendo o levantamento em todos os municípios para confirmar ou não as informações das prefeituras.
A comissão foi criada pelo governo federal por solicitação dos governadores de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB), e de Alagoas, Ronaldo Lessa (PSB), que já previam o surgimento de problemas com os decretos de estado de calamidade pública em período eleitoral.
Esses decretos, na prática, liberam os prefeitos e candidatos à reeleição de compromissos como as licitações para efetuar compras e determinar as empresas que farão obras. Com isso, fica mais fácil burlar a legislação eleitoral e praticar, por exemplo, o clientelismo.
Ontem, foram registradas denúncias formais contra quatro prefeitos que estariam distribuindo "santinhos" no meio das 350 toneladas de alimentos entregues pelo Exército, em Alagoas.
O presidente do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de Alagoas, Jairon Maia Fernandes, criou um disque-denúncia contra a ação dos candidatos das cidades atingidas. O número é 0800820067. "Tem gente que está colocando uma obra ou outra a mais. São pessoas insensíveis, que não deixam de ir atrás de votos nem para socorrer os flagelados", afirmou.
O prefeito de Matriz do Camaragibe também está pedindo pouco mais de R$ 10 milhões para reconstruir a cidade. Nas informações, ele chegou a dizer que 99% dos moradores estavam desabrigados. Ontem, estes números foram reduzidos para 50%.


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