São Paulo, sexta-feira, 08 de agosto de 2008

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Portadores de HIV são expulsos de favela

Filha de portadora foi agredida por bandidos no morro do Querosene, centro do Rio, e obrigada a se mudar com família

No caso ocorrido em 2005, as duas casas da família foram ocupadas por outros moradores da comunidade por ordem dos traficantes

FÁBIO GRELLET
DA SUCURSAL DO RIO

A Prefeitura do Rio de Janeiro investiga denúncia de que ao menos seis portadores do vírus HIV foram obrigados por bandidos a abandonar suas casas em comunidades controladas pelo tráfico de drogas.
Joana (nome fictício), 22, filha de uma portadora do vírus da Aids, foi agredida por "quatro ou cinco" bandidos do morro do Querosene, no Estácio (região central do Rio) em 2005. "Nem imaginava que corria esse risco", diz. Os bandidos distribuíram socos e chutes e depois avisaram: a mãe dela deveria se mudar.
"Eu havia descoberto a doença cerca de um ano antes e estava me tratando. Tinha emagrecido muito e perdido cabelos, mas não havia contado para os vizinhos sobre o vírus, mas notícia se espalhou e várias pessoas passaram a me olhar feio. Eu já planejava me mudar, mas isso apressou muito as coisas", conta Maria (nome fictício), 45, mãe de Joana, que se mudou com a filha e os dois netos para Santa Cruz (zona oeste).
"Fiquei muito assustada e larguei tudo. Minha casa e a da minha filha foram ocupadas por outros moradores, por ordem dos bandidos, e nem pudemos levar as nossas coisas", conta ela, que registrou o caso na 6ª DP (Cidade Nova).
"Mas não fiz muita questão de levar o caso adiante, porque uma parte da minha família continua morando lá".
Agora morando em Cabuçu, bairro de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, Maria conta que só voltou à comunidade de onde foi expulsa uma vez. "Não subi. Combinei que a pessoa iria descer e, enquanto a esperava, um rapaz armado passou me perguntando o que fazia ali e chegou a atirar para cima. Depois disso, nem ao pé do morro eu voltei", afirma.
Segundo ela, a maioria dos agressores da filha morreram, mas nem isso faz com que ela se sinta segura para voltar a morar no morro. As duas casas que foram ocupadas por moradores por ordem dos bandidos não eram legalmente registradas.
Um derrame paralisou o lado direito do corpo de Maria, que hoje sobrevive com o auxílio-doença do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social). Sua filha está desempregada. A família recebe auxílio de entidades assistenciais.
"Conheço gente que mora em morro, também tem o vírus e morre de medo de que os bandidos descubram. Uma amiga do São José, em Madureira, tem até o cuidado de não jogar no lixo do bairro os frascos de remédio", diz Maria.
Para Fransérgio Goulart, historiador e integrante do Cedaps (Centro de Promoção da Saúde), uma ONG que também atende vítimas da Aids, o preconceito e as ameaças aos doentes são comuns. "Já vi muitas situações desse tipo. Os bandidos sabem como a doença é transmitida, mas acham que a pessoa vai transar sempre sem camisinha e espalhar a doença. A única forma de combater esse preconceito é a informação."
A Secretaria Municipal de Assistência Social apurando as expulsões e por isso se nega a comentar os casos.


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