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Agressão a crianças continua, diz ONU
Em 2002, houve 53 mil homicídios de menores de 18 anos e 150 milhões de meninas submetidas à violência sexual
Estudo diz que faltam estratégias adequadas para combater o problema, que ainda esbarra no medo de denunciar os agressores
LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A proteção às crianças contra
todas as formas de violência,
apesar de ser um compromisso
assumido pelos países que integram as Nações Unidas, ainda
está longe de ser cumprida.
Mesmo com os progressos
obtidos nos últimos anos, principalmente relacionados à legislação, as estratégias adotadas por governos e sociedade
civil tendem a ser fragmentadas e com recursos insuficientes para combater o problema.
O reflexo disso está, por
exemplo, em 53 mil homicídios
de crianças registrados no
mundo em 2002 e outros 150
milhões de casos de meninas
com menos de 18 anos forçadas
a manter relações sexuais ou
que foram vítimas de algum tipo de abuso no mesmo ano. Entre meninos, o problema também perdura, atingindo 70 milhões deles. Já em 2004, chegava a 218 milhões o número de
crianças trabalhando, sendo
126 milhões delas em atividades consideradas perigosas.
Esse quadro é descrito no relatório inédito "Estudo das Nações Unidas sobre a Violência
contra Crianças". O trabalho
foi coordenado pelo professor e
pesquisador Paulo Sérgio Pinheiro, ligado ao Núcleo de Estudos da Violência da USP
(Universidade de São Paulo),
como especialista independente designado pelo secretário-geral da ONU, Kofi Annan.
Contou com o apoio do Unicef (braço das Nações Unidas
que trata da promoção e defesa
dos direitos das crianças) e será
apresentado à Assembléia Geral da ONU, na quarta-feira. No
mesmo dia, a Folha promoverá
um debate sobre o tema (leia
texto nesta página).
O documento é baseado em
relatórios encaminhados por
132 governos, consultas a organizações da sociedade civil
-incluindo opinião das próprias crianças- e visitas realizadas em 17 países.
Família
O trabalho aponta a família
como "fonte poderosa de proteção", já que a maior parte dos
casos de agressão, violência ou
negligência é praticada por pessoas próximas da vítima, como
pais e familiares.
Considera violência desde as
formas mais explícitas de
agressão -abuso sexual, espancamentos- até as que chegam a
ser aceitas pela sociedade como
uma das maneiras de buscar
"disciplinar" a criança.
Trata todas como injustificáveis e possíveis de serem prevenidas. "A disciplina por meio de
punições físicas e humilhantes,
"bullying" (intimidação) e assédio sexual é freqüentemente
percebida como normal, particularmente quando não provoca lesões físicas "visíveis" ou duradouras", diz o texto.
Invisível
O relatório indica que, muitas vezes, a violência contra
menores de 18 anos é camuflada. Isso porque as pessoas têm
medo de denunciar agressões e
abusos, aceitam certas formas
de violência ou não encontram
mecanismos seguros e confiáveis para fazer as denúncias.
"Em todas as regiões, contradizendo obrigações de respeito
aos direitos humanos e às necessidades de desenvolvimento
da criança, a violência contra
crianças é um fenômeno socialmente aprovado e freqüentemente legal e autorizado pelo
Estado", diz o documento.
O estudo afirma que 106 países não proíbem o uso de castigo corporal na escola.
No Brasil, tramita no Congresso um projeto de lei proibindo o castigo físico seja no
lar, na escola ou em instituições
e abrigos. Pela proposta, caso
seja comprovada a agressão,
mesmo que sob o argumento de
método pedagógico, os responsáveis podem ser encaminhados, por exemplo, a órgãos de
atendimento psicológico.
O país conta também com o
ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente) -apesar de nem
todos os artigos vigorarem plenamente- e com o serviço disque-denúncia nacional.
Por meio do número de telefone 100, pessoas podem denunciar desde casos de abuso
sexual até agressões e tráfico de
crianças. Funciona das 8h às
22h. Nos primeiros seis meses
do ano, teve 6.020 denúncias.
Do total de casos registrados
até hoje pelo serviço, 15% são
de abuso sexual.
Recomendações
O relatório traz, além de sugestões direcionadas a famílias,
escolas, instituições e locais de
trabalho, 12 recomendações gerais voltadas aos governos.
Uma delas é que os países
adotem medidas mais efetivas
para acabar com todas as formas de violência. Sugere ainda
o incentivo a campanhas educativas, visando modificar atitudes de tolerância ou aceitação da violência. Aponta também para a necessidade de serem implantadas políticas preventivas aliadas a programas
sociais de combate à pobreza, à
desigualdade de gênero e a diferenças sociais.
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