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CLARICE MONTEIRO GIGLIO (1901-2008)
A memória de um século e sete anos
ESTÊVÃO BERTONI
DA REPORTAGEM LOCAL
Clarice Monteiro Giglio
com certeza saberia dizer
quantos descendentes deixou. Tinha a memória tão
boa e cheia de histórias que,
da última vez em que o filho a
visitou, levou um gravador
para registrar a conversa.
Os tataranetos são fáceis
de contar: três. Com netos e
bisnetos, a tarefa é árdua,
mas a família chuta algo entre 23 e 16, respectivamente.
Dos 11 filhos, apenas cinco
estão vivos. Alguns podem
até ser agrupados conforme
o nome: Ilady, Sady, Iray,
Itagy e Jocy. Mas não só de
"y" se fizeram os filhos. Houve também Milton e Mirtes.
Clarice viveu tão lúcida
por 107 anos que se recordava até de Guilhermina, Constantina, Amância e Eugênia,
escravas libertas que lhe bateram à porta de casa, quando ainda morava na cidade
natal de Jacupiranga, a 218
km de São Paulo, para lhe pedir mingau de trigo.
Filha de um comerciante
português, casou-se com Ângelo, um professor de música
-que depois tornou-se também comerciante em São
Paulo. O namoro começou
com troca de bilhetinhos.
Temerosos dos soldados
que ocuparam a cidade durante a Revolução de 32, refugiaram-se num sítio.
Em 1972, ficou viúva. O
que mais queria, dizia, era
não ver os filhos morrerem.
No começo do ano, fizeram-lhe festa de aniversário.
No ano que vem, planejava
ela mesma fazer a festa para
a família, para agradecê-los.
No domingo, morreu em
São Paulo, de "velhice".
obituario@folhasp.com.br
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