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RACISMO
Acusados afirmam seguir integralismo sem orientação fascista
Carecas do ABC dizem defender as minorias
SÍLVIA CORRÊA
da Reportagem Local
Dois dos rapazes presos sob
acusação de ter participado do assassinato do adestrador de cães
Edson Neris da Silva, 35, disseram
ontem em entrevista à Folha que
o grupo Carecas do ABC, ao qual
pertencem, não têm ideais discriminatórios e prega apenas o nacionalismo e a melhoria das condições de vida da população.
De acordo com o inspetor de segurança José Nilson Pereira da
Silva, 27, e o ajudante de despachante aduaneiro Juliano Filipini
Sabino, 28, o grupo se inspira nas
idéias do escritor Plínio Salgado,
que fundou na década de 30 a
Ação Integralista Brasileira.
O movimento de Salgado tinha
orientação fascista, mas a tendência é negada pelos acusados.
Neris foi espancado até a morte
quando passava pela praça da República (centro de SP) à 0h10 do
último domingo. Há 18 detidos
acusados pelo assassinato.
Silva e Sabino falaram à Folha
no 4º DP (Consolação). A entrevista foi acompanhada pela advogada dos dois, Neide da Silva Vieira. Leia alguns trechos:
Folha - Vocês participaram do
crime da praça da República?
Juliano Felipini Sabino - Não.
A gente não defende a violência.
Folha - E o soco-inglês?
Sabino - Eu não carregava nada. Não sei disso. Quem comete
um crime não fica na área.
Folha - Onde vocês estavam
no momento do crime?
José Nilson Pereira da Silva - A
gente saiu da estação da Luz e foi
para o Bixiga (local da prisão).
Folha - Os 18? Juntos?
Silva - Os 18 juntos.
Folha - Que trajeto fizeram e a
que horas chegaram ao bar?
Silva - Por volta de meia-noite.
A gente veio de São Caetano e
desceu na Luz. Foi pela Prestes
Maia e pelo Anhangabaú.
Folha - Passaram numa boate?
Sabino - A gente passou no Madame para ver se tinha alguém do
grupo. Mas a gente nunca fica lá.
Eles não deixam a gente entrar
porque acham que vai sair briga.
Folha - Mas um dos rapazes, o
Fernando Azadinho, disse à polícia que uma parte do grupo já
estava no Bixiga quando outra
parte chegou da República...
Silva - Não foi assim.
Folha - Ele também disse que
o grupo tem idéias fascistas...
Sabino - É a palavra dele... Não
sei se ele foi coagido a falar isso.
Silva - Se fosse assim, eu não estaria no grupo. Eu e mais alguns.
Somos negros. A gente não é racista nem nazista. A gente é nacionalista e defende o nosso povo.
Folha - O grupo é organizado?
Silva - A gente estava tentando
formar uma entidade para difundir o ideal nacionalista. O nome
seria Frente Nacional. Já tinha o
apoio de duas empresas para a
gente distribuir cesta básica para
velhos e ex-drogados.
Folha - O que é o ideal nacionalista para vocês?
Sabino - O Brasil para todos.
Para branco, negro, mestiço, índio. Para que todo mundo tenha
uma condição de vida melhor.
Folha - Um grupo que defenderia os discriminados? Inclusive nordestinos e homossexuais?
Silva - Exatamente, senhora.
Eu, por exemplo, sou baiano.
Folha - Quem os inspira?
Sabino - Plínio Salgado e Gustavo Barroso. Se Deus quiser, a gente vai ter o nosso partido.
Folha - Fascista...
Sabino - É o que você está dizendo. O integralismo é contra o
fascismo. É o nacionalismo brasileiro. Você está lendo o livro de
história errado. Não adianta ver
só um lado da moeda. Um revisionista vê os dois lados.
Folha - Você é o líder?
Sabino - No grupo Carecas do
ABC não existe liderança. Todos
têm o direito de se expressar. O
que existe é o respeito a quem está
a mais tempo na entidade.
Folha - Há quanto tempo vocês estão no Carecas do ABC?
Sabino - Muito tempo. Mais de
dez anos. Foi o modo que achei de
ter um corpo são e uma mente sã.
Silva - O grupo começou em 82.
Eu estou há uns dez anos. No grupo, a gente tem que trabalhar e
progredir. Se entra uma pessoa
que não quer trabalhar, tem que
sair. A gente faz panfletagem contra as drogas e pelo patriotismo.
Folha - Dizendo o quê?
Sabino - Dizendo, por exemplo:
"Se seu amigo usa drogas, que
droga de amigo é você?".
Folha - Por que vocês não disseram tudo isso à polícia?
Sabino - Porque o pessoal da
delegacia falou que era mais rápido em juízo. A cabeça está complicada, mas a verdade vai surgir.
Não somos o cachorro da rua que
estraçalha qualquer outro.
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