São Paulo, quarta-feira, 09 de fevereiro de 2000


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RACISMO
Familiar afirma que acompanhante de vítima correu e pode não ter condições de reconhecer o grupo
Amigo não viu agressores, diz sua mãe


SÍLVIA CORRÊA
da Reportagem Local

O digitador Dário Pereira Netto, 34, tido pela polícia como a principal testemunha da morte do adestrador de cães Edson Neris da Silva, 35, não viu com clareza a fisionomia dos agressores e pode não conseguir reconhecê-los.
A informação foi dada na noite de ontem à Folha, por telefone, pela mãe de Netto, a dona-de-casa Iracema do Carmo Netto, 62. Ela recebeu ontem a intimação de seu filho e afirmou que ele comparecerá para depor hoje.
Neris da Silva foi espancado até a morte à 0h10 do último domingo na praça da República (centro de SP). No momento do crime, ele estava em companhia de Netto, que conseguiu fugir e entrar na estação de metrô da praça.
Quando o grupo de agressores se afastou, o rapaz ajudou a socorrer o amigo à Santa Casa de Misericórdia e registrou a ocorrência na polícia. Na ocasião, porém, forneceu um endereço incorreto.
Três horas depois, com base em relatos feitos por dois moradores de rua, 18 pessoas foram detidas sob acusação de terem participado do espancamento. Netto, porém, não foi mais localizado pela polícia para reconhecê-los.
"Ele me disse que foi tudo rápido. Ele ficou nervoso e só pensou em escapar. Não viu nada direito. Sabe que eram carecas, mas não viu a cara de ninguém. Imagina se é você e uma amiguinha sua. Você vai ficar ou vai correr?", indagou a mãe do rapaz. "A mão de Deus impediu que ele caísse no chão. Deus fez com que meu filho escapasse desses pilantras."
De acordo com Iracema, Neris e o filho dela conversavam na praça quando um grupo de carecas os cercou e passou a agredi-los.
A dona-de-casa disse não saber de onde o filho vinha nem para onde ia. "Ele é muito fechado. Só vai falar amanhã (hoje) porque é obrigado", disse Iracema.
O rapaz, segundo sua mãe, foi atingido com um chute na barriga e outro nas costas, mas conseguiu ficar em pé e correr. "Ele é vítima também. Viu menos do que os tais mendigos", afirmou, referindo-se às testemunhas do caso.
Iracema não quis fornecer o endereço do filho -que é solteiro e mora sozinho- e disse não saber o motivo pelo qual a polícia não tem o registro correto.
Ela confirmou a informação fornecida à reportagem pela Credicard S.A., segundo a qual Netto está afastado do trabalho desde agosto de 98 e recebe pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). "Ele digitava seis horas por dia. Ficou com aquele problema no ombro que parece tendinite. Faz tratamento até hoje."
De acordo com o delegado Francisco Missaci, titular do 3º DP, se Netto depuser e confirmar que também foi agredido, o grupo detido poderá ser indiciado também sob acusação de tentativa de homicídio. Eles já são acusados de homicídio doloso e formação de quadrilha.
Anteontem, um homem se apresentou espontaneamente à polícia para relatar o que viu na praça da República no domingo. Seu nome, de acordo com o delegado Antônio Carlos Cândido Araújo, será mantido em sigilo.
Ele afirmou, sempre segundo o delegado, que viu a agressão e reconheceu os detidos pelas imagens veiculadas no "Fantástico" da Rede Globo. Mais uma vez, os presos não foram submetidos a reconhecimento pessoal.
É a terceira testemunha ouvida no caso. Os outros dois são moradores de rua que afirmaram que as agressões contra homossexuais e mendigos acontecem há pelo menos três finais de semana.


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