São Paulo, quinta-feira, 09 de março de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A ação no Rio é descabida e fere a Constituição, declara advogado

VICTOR RAMOS
DA REDAÇÃO

Para o advogado Walter Ceneviva, a ação do Exército no Rio de Janeiro -que procura armas roubadas de um quartel- fere a Constituição. Segundo o advogado, que é colunista da Folha, a Constituição não inclui entre as funções das Forças Armadas o papel de polícia. "[As Forças Armadas] existem com a função da defesa da soberania nacional."

 

Folha - Como o senhor avalia a legalidade da ocupação do Exército no Rio?
Walter Ceneviva -
A regra principal da Constituição alude a que os Estados, tanto quanto a União e os municípios, são autônomos. Ou seja, essa regra significa que nem o Estado pode intervir no município nem a União pode intervir nos Estados, a não ser nos casos previstos em lei. Isso decorre do artigo 18. A intervenção é de tal modo excepcional que, como regra, é proibida. Portanto essa autonomia nem a [governadora] Rosinha [Matheus] nem o governo federal poderiam quebrar.

Folha - A atual situação não se enquadra nas exceções previstas na legislação?
Ceneviva -
Não se enquadra. Até porque a intervenção depende de autorização congressual e uma série de coisas. Tem algo mais e, de novo, ela [a ocupação] é descabida. Tendo havido furto ou roubo de equipamentos militares -ou seja, questão da competência da Polícia Federal- pergunta-se em que medida [a ação do Exército] teve autorização da Justiça Federal. Se houver ofensa a direito da União, decorre das normas da segurança pública que quem tem de investigar é a Polícia Federal.

Folha - Segundo o Exército, a ação se baseia, no aspecto legal, em um IPM (Inquérito Policial Militar).
Ceneviva -
O que quer que dissesse o IPM, ele não é compatível com a extensão aparente daquilo que se vê no Rio de Janeiro. Ou seja, evidentemente, o IPM, de natureza administrativa, movido pelas Forças Armadas, pode ser perfeitamente conduzido. Mas não nesta extensão. Porque há uma intromissão na liberdade, na autonomia e na condução de coisas do interesse do Estado. As funções das Forças Armadas, segundo o art. 142 [que determina, entre outros itens, a defesa do país e dos poderes constitucionais], não compreendem o exercício de polícia. Elas existem com a função da defesa da própria soberania.

Folha - A opressão que parte da população vem sentindo com a ocupação também é questionável do ponto de vista jurídico?
Ceneviva -
Diria que é uma extrapolação da irregularidade originária. O Exército entendeu que poderia assustar os ladrões, diante da incompetência ou da participação daqueles que tinham a incumbência de guardar as armas. Agora está querendo mostrar para a moçada que se fizer isso vai sofrer. É uma questão psicológica, mas não é regular nem legal.


Texto Anterior: Violência: "A favela está vazia", afirma voluntário
Próximo Texto: Sociedade pressiona Exército a ter papel de polícia, diz pesquisadora
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.