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CONSUMO
Devedor fica com carro se pagar atraso
RITA NAZARETH
da Reportagem Local
Você deixou de pagar uma parcela do financiamento do seu veículo e agora terá de devolvê-lo,
sem possibilidade de recorrer. Se
você pagou pelo menos 40% do
valor do financiamento, poderá ficar com o bem, mas terá de pagar,
de uma vez, o atraso e o resto da
dívida. Certo? Errado.
Segundo o Código de Defesa do
Consumidor, são nulas as cláusulas contratuais que estabelecem
perda total das prestações pagas
em benefício do credor. Dessa forma, a empresa não pode pôr fim
ao contrato e exigir a retomada do
bem devido ao atraso no pagamento de prestações.
"O consumidor que quiser pagar
o valor atrasado pode e deve fazê-lo para ficar com o bem", diz o
promotor de Justiça Marco Antonio Zanellato, do Ministério Público de São Paulo. "Vale ressaltar
ainda que não está estipulado no
código que o devedor depende de
um valor mínimo, já pago, para
continuar no negócio."
"Apenas o credor sai beneficiado
com esse tipo de contrato", diz Zanellato. "A empresa desfaz o negócio, fica com o carro, com o dinheiro pago e com o valor obtido
com a venda do veículo em leilão."
O grande problema, segundo
ele, é que as empresas têm uma base legal sustentando esses procedimentos. "Um decreto-lei de 1969,
ainda em vigor, é o argumento das
concessionárias", diz .
Segundo a lei, quando o bem está alienado, ou seja, quando ainda
é de propriedade do credor, e o devedor atrasa o pagamento, o contrato pode ser encerrado segundo
a vontade do credor.
Sem conversa
Há dois anos, o professor de tênis Adriano de Oliveira Souza, 29,
fez um contrato de financiamento
com a Conprof Administradora de
Consórcio, que fica no bairro da
Consolação, na região central de
São Paulo.
Por estar desempregado, ele
conta que deixou de pagar seis
parcelas do financiamento e, por
isso, teve de devolver seu carro à
Conprof.
"Mas eu já tinha pago mais da
metade das prestações do carro",
diz Souza. Seu advogado, Fernando Cabeças Barbosa, afirma que
ele pagou 26 das 50 prestações e,
mesmo assim, seu carro foi levado, sem possibilidade de ser retomado.
"A concessionária me informou
na época que, se eu quisesse ter o
bem de volta, deveria pagar, além
do valor em atraso corrigido, o
resto das prestações de uma só
vez", diz o professor.
Souza afirma ainda que, por não
querer perder o carro, entrou na
Justiça, pagou as mensalidades
atrasadas e continua pagando as
parcelas do carro em juízo.
"A concessionária, no entanto,
agiu de má-fé, porque não está
mandando boletos bancários para
a casa de Adriano (Souza)", diz
Barbosa. "Por isso, ele decidiu pagar em juízo a sua dívida."
A Conprof Administradora de
Consórcio dá sua versão (leia texto
ao lado).
Vale lei posterior
Por considerar extremamente
lesivo ao consumidor, o juiz relator do caso considerou o decreto-lei 911 sem efeito.
"O que vale é a lei posterior, ou
seja, o Código de Defesa do Consumidor", diz o juiz Cláudio Soares Levada, do 2º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo.
"É evidente, no entanto, que se
o atraso não for pago, o carro não
será devolvido", diz o juiz.
"Essa decisão deverá abrir caminho para novas ações, que deverão
mudar a conduta abusiva de certas
concessionárias no Brasil inteiro",
diz Zanellato.
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