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AMBIENTE
Nem mosquitos conseguem sobreviver à ação de água contaminada por metais pesados em área da baía de Sepetiba
Barragem rompe e polui mangue no Rio
SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL A ITAGUAÍ (RJ)
A barragem da Companhia
Mercantil e Industrial Ingá (Itaguaí, cidade a 70 km do Rio), que
armazena cerca de 50 milhões de
litros de água contaminada por
metais pesados, se rompeu em
dezenas de pontos. Água e lama
tóxicas estão escorrendo diretamente para os manguezais da
baía de Sepetiba.
Pelo menos 6.000 metros quadrados do mangue já foram atingidos. O vazamento devastou cerca de 300 metros quadrados do
manguezal. No trecho mais afetado pelos vazamentos, a lama soterrou a vegetação. Só restaram
tocos de madeira.
O desastre ecológico tantas vezes anunciado por ambientalistas
já começou.
Não há mais caranguejos nos
trechos do manguezal em torno
do lago. Também não há peixes.
As aves não voam na região, conforme a Folha constatou ontem
no local. Não há garças ou outras
espécies de pássaros aquáticos,
habitantes costumeiros de lagos
como o da Ingá, empresa que faliu
há oito anos e está abandonada.
Sem insetos
O mais incrível é que nem insetos são notados. Aquele trecho do
litoral do Estado do Rio, conhecido como Costa Verde -vai de
Itaguaí a Parati, na divisa com São
Paulo-, é famoso pelos mosquitos, que incomodam moradores e
visitantes. Não há mosquitos em
volta do lago.
A água está escorrendo para os
manguezais por fissuras no dique
de argila que circunda o lago. Ao
longo de 300 m, há pelo menos 50
sulcos de água escapando diretamente para o mangue a partir de
reentrâncias na estrutura do dique. Formam riachos que serpenteiam pelo terreno até alcançar a
vegetação. Há trechos do mangue
já completamente soterrados.
O problema tem se agravado
com as chuvas recentes. Em fevereiro, o diretor da Divisão de Meio
Ambiente da Prefeitura de Itaguaí, Vinícius Leandro, vistoriou
o reservatório. Ontem de manhã,
ele voltou ao local.
Leandro constatou que o dique
está perto de uma ruptura total.
"A situação piorou bastante. A
água está vazando para os manguezais. O reservatório está quase
transbordando. O dique pode se
romper na próxima chuva", previu ele. Os temporais têm sido
diários na região.
O lago se formou ao longo dos
últimos 40 anos. A indústria Ingá,
que entrou em operação na década de 50, depositava os resíduos
da produção de lingotes de zinco
em um terreno junto aos manguezais da baía de Sepetiba.
Os resíduos tóxicos formam hoje uma montanha de 15 metros de
altura por 100 metros de largura.
Com as chuvas, o material escorre
para dentro do lago, aumentando
ainda mais o seu volume.
Hoje, o lago, cuja profundidade
máxima é estimada em dez metros, está a centímetros da borda
do dique.
Na edição do último domingo, a
Folha mostrou os riscos que a
barragem da Ingá representa para
o ecossistema da baía de Sepetiba,
um dos mais belos trechos litorâneos do Estado do Rio.
Em 1996, o dique já se rompera
durante uma tempestade, contaminando a baía. A pesca na região
foi bastante afetada. Houve mortandade de peixes.
Análises químicas mostraram
que moluscos e ostras espécies foram contaminados. O consumo
de peixes que ingeriram os metais
pesados depositados no mangue e
na baía pode causar doenças que
afetam os sistemas nervoso e motor e levam à morte se não houver
tratamento adequado.
Presença de metais
O diretor do Laboratório de Radioisótopos do Instituto de Biofísica da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Olaf Malm,
vistoriou o dique no ano passado,
acompanhado de representantes
do Ministério Público do Estado,
do governo do Rio de Janeiro e do
Ibama (Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis).
Malm recolheu cristais ao longo
do entorno do lago. A análise das
amostras revelou a presença de
cádmio, chumbo e cobre.
"A água escorre, o rejeito seca e
forma cristais. É uma mostra de
que o dique está enfraquecido. É
um caso bastante grave. O cádmio, por exemplo, é um metal
muito tóxico", disse ele.
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