São Paulo, sábado, 09 de abril de 2005

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MASSACRE NA BAIXADA

5 policiais mexeram em projétil e cadáver, diz morador
Cena do crime foi alterada por PMs, diz testemunha

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Policial guia carro com o soldado Carlos Jorge de Carvalho após o depoimento do acusado de participar dos assassinatos na Baixada


MARIO HUGO MONKEN
SERGIO TORRES

DA SUCURSAL DO RIO

No mais detalhado relato sobre a chacina de 30 pessoas na Baixada Fluminense, no dia 31, uma testemunha ouvida pela Polícia Federal diz ter visto, minutos após as mortes num lava-a-jato em Queimados, cinco policiais militares tirando projéteis do chão e mexendo nos cadáveres.
O depoimento pode complicar a situação do cabo José Augusto Moreira Felipe e dos soldados Júlio César do Amaral, Ivonei de Souza e Maurício Jorge da Matta Montezano, 4 dos 8 presos por suspeita de participação no massacre e que haviam apresentado álibis para o horário dos crimes.
O quinto policial que a testemunha diz ter visto no lava-a-jato não foi reconhecido. O nome da testemunha está sob sigilo. No local morreram quatro pessoas.
Ontem, a polícia obteve nova prova técnica que indica que o Gol prata -cedido ao soldado Carlos Jorge de Carvalho, 1 dos 8 presos e 1 dos 2 apontados como atirador (ontem, uma testemunha reconheceu o cabo Gilmar da Silva Simão)- foi usado na ação.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, uma cápsula recolhida no lava-a-jato em Queimados saiu da mesma pistola das três cápsulas achadas no veículo.
Anteontem, já havia sido comprovado que outras três cápsulas achadas em Nova Iguaçu eram idênticas às do Gol prata. Para os investigadores, isso evidencia que o mesmo carro foi usado em ao menos dois locais diferentes (e nas duas cidades) da matança.

Tiros para o alto
Segundo a testemunha, os tiros foram dados por quatro pessoas mascaradas. No instante do crime, a testemunha diz que passaram dois carros da PM. Os policiais deram dois tiros para o alto e foram embora sem socorrer as vítimas, afirma o depoimento.
Logo em seguida, diz o depoente, chegou ao local um Santana prata que seria do serviço reservado. Do carro, desceram os soldados Montezano e Souza, que, afirma a testemunha, retiraram projéteis e mexeram nos cadáveres.
O relato diverge do que dizem os PMs. Montezano disse na Assembléia Legislativa que estava no gabinete do tenente-coronel Marco Aurélio Hippertt, comandante do batalhão, quando chegou a notícia de que pessoas estavam sendo mortas em Queimados. Souza disse que estava com a família.
Pouco após a saída do Santana, afirma a testemunha, apareceu um Vectra branco, onde estavam o cabo Felipe, o soldado Amaral e um PM ainda não identificado.
A testemunha diz que os três, em cerca de dez minutos, mexeram na cena do crime; Felipe falava em um radiotransmissor. Em depoimento, Felipe e Amaral disseram que estavam com parentes.
Em entrevista à Folha ontem, o comandante do batalhão negou que Montezano estivesse em seu gabinete. "Sou o comandante da unidade. Ele não teria motivos para estar em meu gabinete", afirmou Hippertt. "Vejo soldados a toda hora. Não fico reparando na hora em que vejo cada um deles nem anoto os nomes e registros. Não posso dizer que ele estava aqui na hora daquela bestialidade. Ele era P2 [trabalha à paisana, uma espécie de serviço secreto do batalhão]. Tinha liberdade para se deslocar aos locais de crimes."
"Além do mais, ele poderia estar aqui, ter dado uma saída, matado alguém e voltado. Não posso confirmar esse álibi", afirmou.


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