|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Fomos tragados pela lama, dizem moradores
Maioria das pessoas ouvidas pela Folha afirma que sabia do risco de morar no morro do Bumba, onde ocorreu o deslizamento
Famílias fazem peregrinação por hospitais públicos da cidade em busca de informações sobre parentes desaparecidos
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
Após três dias de chuva intermitente, Niterói parece uma
zona de guerra. Feridos que sobreviveram aos deslizamentos
em diferentes morros circulam
pelos hospitais públicos em
busca de informações sobre parentes que estão internados ou
desaparecidos.
Na entrada do hospital Azevedo Lima, eles descrevem de
forma parecida o momento em
que foram tragados pela lama,
ou ficaram soterrados sob paredes e pedaços de laje.
A maioria dos ouvidos pela
Folha admitiu saber que estava
em uma área de risco.
""Eu sabia que o morro do
Bumba tinha sido um lixão.
Quando mudei para lá, em
2000, caminhões ainda descarregavam lixo lá. Eu sabia que
era arriscado morar lá, mas
acreditei na sorte", afirmou Rosélia Batista Lopes, que buscava informações dos dois filhos.
Ela se mudou para um outro
morro, em Niterói, há duas semanas, mas os filhos estavam
no morro do Bumba.
Patrick Batista Mota, 15, vivia no morro do Bumba, com o
pai, três irmãs e a madrasta, numa casa de dois andares, construída sobre o antigo lixão. Ele
escapou por um buraco que se
abriu no teto e, na fuga, feriu
um braço e uma perna.
Uma das irmãs dele, Valeska
Batista Motta, 17, foi resgatada
por bombeiros, e saiu com escoriações leves.
""Fiquei uns 20 minutos de
cara para o chão, e com a laje
sobre o meu corpo. Os bombeiros pediam para eu ficar gritando para me localizar. Passei
muito medo, e pensei que ia
morrer", disse Valeska.
Cintia Ribeiro, 28, perdeu
três primos soterrados no morro do Caramujo, na segunda-feira: um jovem de 15 anos e
duas meninas, de 9 e 7 anos.
A mais nova, Cassiane, continua soterrada. Os corpos dos
outros dois -Júnior da Silva
Pinto, 15, e Caroline, 9- estão
no Instituto Médico Legal porque a documentação necessária para a liberação dos corpos
se perdeu na tragédia.
Durante uma hora em que
esteve na entrada do hospital
Azevedo Lima, a Folha ouviu
relatos sobre pessoas que ainda
estariam soterradas em quatro
morros em Niterói.
Um morador do morro do
Castro contou que dois homens estão soterrados próximos ao Bar do Lourival e pediu
que a reportagem avisasse aos
bombeiros.
Vanessa Silva Santos, 23, sobrevivente de um deslizamento na favela São José, contou
que perdeu cinco parentes, na
segunda-feira, e que os corpos
ainda não foram enterrados,
porque estão aguardando os
sobreviventes saírem do hospital para irem ao enterro.
Com vários ferimentos nas
pernas, ela foi retirada dos escombros por vizinhos. Do momento da tragédia só se lembra
que, "de repente, desceu lama,
desceu pedra, e as paredes vieram abaixo".
Texto Anterior: Total de favelas em Niterói cresceu 200% Próximo Texto: Frase Índice
|