São Paulo, sexta-feira, 09 de abril de 2010

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Fomos tragados pela lama, dizem moradores

Maioria das pessoas ouvidas pela Folha afirma que sabia do risco de morar no morro do Bumba, onde ocorreu o deslizamento

Famílias fazem peregrinação por hospitais públicos da cidade em busca de informações sobre parentes desaparecidos

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

Após três dias de chuva intermitente, Niterói parece uma zona de guerra. Feridos que sobreviveram aos deslizamentos em diferentes morros circulam pelos hospitais públicos em busca de informações sobre parentes que estão internados ou desaparecidos.
Na entrada do hospital Azevedo Lima, eles descrevem de forma parecida o momento em que foram tragados pela lama, ou ficaram soterrados sob paredes e pedaços de laje.
A maioria dos ouvidos pela Folha admitiu saber que estava em uma área de risco.
""Eu sabia que o morro do Bumba tinha sido um lixão. Quando mudei para lá, em 2000, caminhões ainda descarregavam lixo lá. Eu sabia que era arriscado morar lá, mas acreditei na sorte", afirmou Rosélia Batista Lopes, que buscava informações dos dois filhos. Ela se mudou para um outro morro, em Niterói, há duas semanas, mas os filhos estavam no morro do Bumba.
Patrick Batista Mota, 15, vivia no morro do Bumba, com o pai, três irmãs e a madrasta, numa casa de dois andares, construída sobre o antigo lixão. Ele escapou por um buraco que se abriu no teto e, na fuga, feriu um braço e uma perna.
Uma das irmãs dele, Valeska Batista Motta, 17, foi resgatada por bombeiros, e saiu com escoriações leves.
""Fiquei uns 20 minutos de cara para o chão, e com a laje sobre o meu corpo. Os bombeiros pediam para eu ficar gritando para me localizar. Passei muito medo, e pensei que ia morrer", disse Valeska.
Cintia Ribeiro, 28, perdeu três primos soterrados no morro do Caramujo, na segunda-feira: um jovem de 15 anos e duas meninas, de 9 e 7 anos.
A mais nova, Cassiane, continua soterrada. Os corpos dos outros dois -Júnior da Silva Pinto, 15, e Caroline, 9- estão no Instituto Médico Legal porque a documentação necessária para a liberação dos corpos se perdeu na tragédia.
Durante uma hora em que esteve na entrada do hospital Azevedo Lima, a Folha ouviu relatos sobre pessoas que ainda estariam soterradas em quatro morros em Niterói.
Um morador do morro do Castro contou que dois homens estão soterrados próximos ao Bar do Lourival e pediu que a reportagem avisasse aos bombeiros.
Vanessa Silva Santos, 23, sobrevivente de um deslizamento na favela São José, contou que perdeu cinco parentes, na segunda-feira, e que os corpos ainda não foram enterrados, porque estão aguardando os sobreviventes saírem do hospital para irem ao enterro.
Com vários ferimentos nas pernas, ela foi retirada dos escombros por vizinhos. Do momento da tragédia só se lembra que, "de repente, desceu lama, desceu pedra, e as paredes vieram abaixo".


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