|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Quadrilha é acusada de criar tribunal paralelo do crime
Grupo atuava em Cajuru (SP) para punir inimigos; espancamento era um dos castigos
Suposto chefe da quadrilha dava ordens, por celular, de dentro da prisão; 12 pessoas foram presas após operação da Polícia Civil na cidade
GEORGE ARAVANIS
DA FOLHA RIBEIRÃO
Uma quadrilha de criminosos de Cajuru (a 311 km de SP)
estabeleceu uma espécie de tribunal paralelo para punir inimigos na cidade. As "sentenças" eram dadas, por celular,
por um criminoso preso na penitenciária de Álvaro de Carvalho (425 km de SP). Entre as ordens estava a de espancar quem
desobedecia a ordens do grupo.
O esquema foi revelado após
uma série de gravações da Polícia Civil local entre janeiro e
março. A investigação começou
após uma suspeita de que havia
uma quadrilha da facção criminosa PCC (Primeiro Comando
da Capital) na cidade.
Foram gravadas cerca de 19
mil conversas com autorização
judicial. Em 15 de março, 12
pessoas foram presas acusadas
de associação ao tráfico na operação "Boca da Mata", em alusão ao apelido de Cajuru. Os
presos negaram à polícia, na
ocasião, participação no crime.
O suposto chefe da quadrilha
é Fernando Aparecido de Oliveira Moura, 28, o Fantasma.
Ele foi preso no ano passado,
em Ribeirão Preto (314 km de
SP), por tráfico de drogas.
Em uma das "sentenças", ele
manda um subordinado surrar
Silvão. Motivo: o "réu" tinha
mania de andar nu na rua. "Tá
pagando uma de doidão, mano?
Vou arrancar sua pele." Silvão
pede desculpas cinco vezes. Em
seguida, reza a Ave Maria.
É possível ouvir o som de tapas. No final da conversa, Fantasma ordena: "Dá um papo reto nesse negócio de ele andar
pelado que ele não é louco não".
Em outra ocasião, Edmar
Caetano da Paixão, 27, o Fininho, apontado pela polícia como o braço direito de Fantasma, determina que um outro
criminoso procure um homem
e uma mulher que teriam assaltado a casa de um casal de idosos. Por telefone, um dos acusados reclama com Fininho: "Vocês não têm democracia". "Vem
aqui que vou te mostrar a democracia", diz Fininho.
Para o delegado Paulo Piçarro, de Cajuru, que comandou as
investigações, as gravações deixam claro o poder da quadrilha
na cidade. "Ninguém podia
roubar sem autorização deles."
A polícia concluiu o inquérito
sobre a quadrilha. O caso está
no fórum de Cajuru e corre em
segredo de Justiça.
O diretor do Deinter 3 (departamento responsável pela
Polícia Civil em Cajuru), George Millard, disse que o teor das
gravações -ele sabia do caso,
mas não do conteúdo- lembra
o Velho Oeste. "É um absurdo.
Querem substituir o Estado."
Segundo ele, a quadrilha é um
caso isolado, e não uma tendência de interiorização do crime.
Para o professor de psicologia social Sérgio Kodato, que
coordena um grupo sobre violência na USP de Ribeirão, é
uma estratégia do crime organizado atuar em pequenas cidades. "Inclusive a proximidade com a população, essa questão de resolver pendências de
moradores, é para conquistar
simpatia e garantir o fortalecimento da organização."
Outro lado
A Folha não encontrou a advogada de Fernando Moura, o
Fantasma. De acordo com o advogado de uma das acusadas,
ele e Edmar Paixão, o Fininho,
não tinham advogado constituído no processo até 15 dias
atrás. Três advogados ouvidos
pela Folha, defensores de quatro dos acusados -que não
aparecem nas gravações que a
reportagem teve acesso- negam a participação de seus
clientes na quadrilha.
Texto Anterior: Reforma ortográfica: MEC autoriza adaptações em livros didáticos Próximo Texto: Terreno da antiga mansão Matarazzo deve virar shopping Índice
|