São Paulo, sábado, 09 de setembro de 2000

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DE BAR EM BAR
Roteiro dos melhores botequins alerta que visitantes devem procurar saber se a situação no local está calma
Guia do Rio inclui botecos de favelas

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Ézio Laurindo da Silva, o Delegado, ex-mestre-sala da Mangueira, no bar da Lili (zona norte)


CRISTIAN KLEIN
DA SUCURSAL DO RIO

As favelas entraram no roteiro etílico e gastronômico do Rio. A nova edição do guia "Rio Botequim", que será lançada na próxima terça-feira, traz como novidade uma lista de 13 botecos e biroscas em cinco favelas da cidade.
O guia indica bares dos morros da Mangueira, do Salgueiro e da Serrinha (zona norte), do Caju (zona portuária) e do Vidigal (zona sul). Mas deixa um alerta: que os interessados, por motivo de segurança, telefonem para a associação de moradores antes de visitar esses lugares.
"É sempre bom saber como está a situação no local. Às vezes pode haver um tiroteio, a polícia pode estar fazendo uma blitz", avisa o jornalista Tim Lopes, responsável pela escolha desses bares para o "Rio Botequim 2001", editado pela Prefeitura do Rio.
O programa é um prato cheio para aqueles que gostam de desafio, afirma Lopes. "É uma aventura tão perigosa quanto sedutora. Visitar um bar de favela é uma desculpa para um bom papo, perto de uma usina de cultura carioca. Você pode cruzar com bambas como Delegado, na Mangueira, ou o compositor Sabiá, no Salgueiro. Tem sempre alguém para contar uma boa história", diz.
Na Mangueira, a maioria dos bares fica perto do asfalto, a poucos metros da quadra da escola de samba. Mas que ninguém espere encontrar uma só dose de sofisticação. No Buraco Quente, centro nervoso da Mangueira, a dona do bar abre a cerveja e joga a tampa pelos ares, para cair na calçada. Lugar para sentar é difícil. Melhor sentar no meio-fio.
Ou bater papo com Delegado, 78, maior mestre-sala da Mangueira. "Delegado foi um apelido que botaram porque eu prendia muito as moças daqui. Prendia para namorar. Mais de uma ao mesmo tempo", disse Ézio Laurindo da Silva.
Delegado toma guaraná. Cervejinha, só de vez em quando. Não belisca nada nos botecos da Mangueira. "É da minha natureza. Não como nada fora de casa."
O jornalista Lopes é da mesma opinião. "A recompensa maior é a cerveja gelada e o bate-papo. É claro que você não vai comer tremoços. É arriscado", diz.
Mesmo assim, o jornalista indica algumas especialidades dos botecos de favelas, como o frango à passarinho do bar dos Caiabas e o sopão servido aos domingos no bar do Bigode, ambos no Salgueiro. Ou então a linguiça calabresa do bar do Zezinho, na Serrinha.
No Vidigal, a dica é o Varandão Rose's Bar, que serve um frango empanado com salada e tem vista para o mar. "Você fica tonto de tanta beleza", afirma.
O critério de seleção teve como ponto de partida os morros mais ligados ao mundo do samba. O Vidigal entrou pela vista privilegiada do mar. E o Caju, com sua Ladeira dos Funcionários, foi selecionado por causa da história.
"O Caju é o início da cidade do Rio, tem cheiro de maresia, de beira de porto, fica perto de São Cristóvão, onde residiu a família real portuguesa", diz o jornalista.
Outro critério foi indicar favelas urbanizadas, com um mínimo de infra-estrutura. "O próprio morador do morro teve sua auto-estima elevada nos últimos anos. Percebe que o lugar onde mora desperta interesse em turistas e moradores do asfalto", afirma.
Nenhum dos botecos recomendados está localizado no meio das favelas. Geralmente eles ficam no pé do morro. "Ninguém deve se enfurnar pela favela. Aí é perigoso. Mas a preocupação com a segurança hoje existe em qualquer lugar. Até na zona sul, em Copacabana, onde tem gangues de garotos da classe média", diz Lopes.
Os botecos de favelas são um capítulo à parte do "Rio Botequim 2001". Criado pela prefeitura em 1998, o guia traz anualmente o ranking com os 50 melhores bares da cidade, apontados por uma comissão de jornalistas. Em 1999, foi criada uma lista com os dez melhores, segundo eleição popular.
O Bracarense, no Leblon (zona sul), é eleito pela terceira vez consecutiva. Ele ganhou nas cinco categorias da eleição: melhor chope, melhor garçom, melhor cozinha, melhor petisco e melhor bar.
"Há dois critérios para um bar ser considerado botequim: não pode obrigar o cliente a fazer refeição nem pode servir chope em copo de plástico", afirma Paulo Thiago de Mello, da comissão do "Rio Botequim".
O lançamento do guia, produzido pela Memória Brasil e editado pela Casa da Palavra, será terça-feira, às 11h, no Bar Brasil, no centro. O preço é R$ 24.


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