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São Paulo, terça-feira, 09 de setembro de 2003

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ABUSO DE PODER

Relatório da SOS Tortura mostra SP como campeão de denúncias

Policiais lideram tortura, diz ONG

FABIANA CIMIERI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Relatório da ONG SOS Tortura que será apresentado em outubro mostra que 78% dos 2.075 casos de tortura denunciados ao governo federal a partir de novembro de 2001 foram atribuídos a agentes institucionais (policiais, agentes penitenciários e monitores de instituições para menores).
A Folha teve acesso aos dados preliminares do relatório. Das 2.075 denúncias recebidas pelo serviço Disque-Tortura, inaugurado em 2001 pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, 614 (31%) ocorreram em delegacias. Em seguida, são citadas casas (19%) e presídios (15%). A tortura é usada como castigo (37%) ou para obter confissão (23%).
Em mais da metade das denúncias, o torturador é um policial. Em um terço das vezes, o agressor é um policial militar (33%). Em 29% das denúncias, um policial civil é o responsável pelas agressões. A Polícia Federal responde por menos de 1% dos casos.
São Paulo é o Estado campeão de denúncias (16%), seguido de Minas Gerais (14%) e Pará (9%).
O SOS Tortura é responsável pela administração do Disque-Tortura, por meio de convênio.

Crime federal
Ao comentar os dados do relatório, o secretário especial adjunto de Direitos Humanos, Mário Mamede, defendeu a federalização do crime de tortura, através da modificação da lei 9.455/97, que tipifica a prática.
"É um crime contra a humanidade. A suspeita de crime de tortura já deveria ser suficiente para deslocar o caso para a esfera federal. É preciso deslocar a influência das corporações locais."
A autonomia das perícias técnicas, hoje subordinadas às polícias, também é vista pelo secretário-adjunto como item fundamental para garantir a isenção nas investigações das denúncias.
Mamede disse acreditar que o número de denúncias feitas ao SOS Tortura está subdimensionado, pois não inclui casos encaminhados às ouvidorias de polícia, delegacias e comissões estaduais de direitos humanos.
"Há um volume de demanda preocupante, que não encontra solução adequada", disse.
Segundo Mamede, "os esforços do governo" para que a tortura seja denunciada "não se traduzem na ponta do problema, que é a punição dos que cometem essa prática criminosa não-prescritível, não-digna de perdão e não-passível de fiança".
A dificuldade de combater a tortura, segundo o secretário, é resultado, em parte, de uma aceitação social da prática: "A gente encontra pessoas que entendem, justificam, explicam e até defendem a prática da tortura. É isso que alimenta a tortura nos porões de algumas organizações policiais".
Para Mamede, descaracterizar o crime de tortura também é um discurso corriqueiro. Nesse discurso, disse ele, insere-se o caso do comerciante chinês naturalizado brasileiro Chan Kim Chang, que morreu na semana passada.


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