São Paulo, sexta-feira, 09 de novembro de 2007

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BARBARA GANCIA

Astolfo na Terra do Nunca


A lei proposta pelo senador Crivella não é bê-á-bá do bom senso e já não deveria estar em vigor há séculos?


COMO DIRIA aquele antigo personagem de Jô Soares: "é um espanto!" Neste caso, um verdadeiro descalabro o desperdício que nosso Legislativo representa.
Segundo estudo realizado pelo Instituto Transparência Brasil, a quantia gasta por minuto pelo parlamentar brasileiro é a mais alta do mundo. Cada senador custa ao bolso do contribuinte R$ 33 milhões ao ano. Deputados custam R$ 6,6 milhões e, em extras, nossos parlamentares consomem mais R$ 10,2 cada um, enquanto um país pobrezinho como a França desembolsa menos da metade, e a Espanha, cerca de um décimo do que os nossos recebem. As assembléias legislativas tapuias não ficam atrás, são dispendiosas, inchadas e ineficientes.
Mas, ao menos, esse mundaréu de gente desinteressada trabalha duro para fazer jus ao tutu que recebe, não é mesmo? Recentemente, em São Paulo, só para citar um dos tantos exemplos gritantes, foi aprovada uma lei proibindo o uso de celular em sala de aula.
Isso mesmo, em vez de tratar de discutir leis que descompliquem a vida do cidadão, em vez de tentar agilizar a educação, a saúde, os transportes e a segurança pública, os representantes da população de São Paulo perdem tempo legislando sobre um assunto que não deveria nem mesmo constar da pauta. Autoridade de professor não se impõe com lei boba.
Mais: na quarta, a Comissão de Constituição e Justiça finalmente aprovou lei proposta pelo senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), proibindo a comercialização e a ingestão de bebidas destiladas e de cerveja em postos de combustível e lojas de conveniência. A proibição vale para estabelecimentos comerciais localizados fora dos perímetros urbanos. A matéria agora deve ser enviada (ai, que sono que me dá!) à Câmara dos Deputados para aprovação.
O pessoal descobriu a pólvora! Ora, ora, qualquer ser invertebrado que tenha contato com adolescentes de classe média, sabe do perigo que representa a venda 24 horas de bebidas alcoólicas. E qualquer batráquio que já tenha circulado de madrugada pelas ruas de São Paulo, do Rio ou de Belo Horizonte conhece o faroeste em que se transforma o trânsito nas noites de quinta, sexta e sábado, quando a molecada resolve misturar bebida e direção.
Será que estou ficando caduca ou, há mais de dez anos, Mário Covas já não havia proibido a venda de bebidas alcoólicas em rodovias? De lá para cá, alguém tratou de fiscalizar os estabelecimentos de beira de estrada para fazer valer a regra? E a nova lei do bispo e senador Crivella não é bê-á-bá em matéria de bom senso e já não deveria estar em vigor há séculos -com a devida fiscalização? Por que tanta lengalenga para aprová-la?
Enquanto isso, na Terra do Nunca em que se transformou Brasília, em que parlamentares com ficha criminal são tratados por "Vossa Excelência" para cá e "Vossa Excelência" para lá, a Câmara cancelou exposição em um de seus salões por conta de uma foto do travesti Rogéria vestindo cuecas, camisa e gravata. Isso, sim, é imagem chocante, né não?
Pois eu conheço pessoalmente Astolfo Barroso Pinto, ou melhor, a Rogéria, e afirmo categoricamente que, em matéria de dignidade, nua ou vestida, ela dá de mil em muito parlamentar de escafandro.

barbara@uol.com.br


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