São Paulo, sábado, 09 de dezembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

WALTER CENEVIVA

Falta espaço à mulher


Na advocacia, predomina o machismo, como regra. Na OAB de São Paulo, nunca houve uma presidente eleita


POR ESTRANHO que possa parecer, o assunto me surgiu ao ver a ministra Ellen Gracie, na condição de presidente do Supremo Tribunal Federal enfrentar, no caso das férias coletivas de juízes, a resistência do Conselho Nacional de Justiça, ao qual ela também preside. Melhor examinando, achei natural. A mulher já se habituou a enfrentar desafios, incorporada há um século ao mercado de trabalho.
Muitas profissões não permitiram a acolhida feminina, por sua natureza considerada incompatível com a mulher. Em outras as resistências nem eram naturais ou justificáveis, caso das profissões jurídicas. Na excelente revista com a qual a Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco comemorou 75 anos do Centro Acadêmico XI de Agosto, 29 caricaturas retratam a realidade histórica de personalidades do mundo jurídico, saídas da Velha Academia. Não há uma mulher entre as mais antigas; há três entre as mais novas.
A evolução tem sido grande, mas não suficiente. Ellen Gracie preside o Supremo Tribunal Federal, com categoria. Carmen Lucia Antunes Rocha, ministra da Corte Suprema saída da advocacia há poucos dias, tem atuado como se nunca houvesse feito outra coisa na vida. Mesmo o Tribunal de Justiça de São Paulo, talvez o mais resistente de todos, tem acolhido desembargadoras em percentual pequeno, mas progressivo.
Nas escolas de direito (sei disso desde os tempos de professor na PUC), a chegada das alunas transformou o panorama do alunado, a princípio e, depois, do corpo docente. A Justiça do Trabalho e a Justiça Federal são mais abertas, mas nelas ainda predomina o universo masculino, salvo umas poucas cortes de justiça, pelo Brasil a fora.
O grande núcleo machista é, contudo, paradoxalmente, a advocacia. Num universo em que as advogadas são cada vez mais numerosas, em que, é a impressão que venho recolhendo há tempos, aparecem numericamente mais bem preparadas que os recém-formados, era de esperar que em eleições e chapas, já se pudesse chegar a um cinquenta-por-cinquenta igualitário. Nem pensar, porém. Predomina o machismo, como regra. Na OAB de São Paulo, nunca houve uma presidente eleita. Idem na Associação dos Advogados de São Paulo. Novo paradoxo: o Instituto dos Advogados de São Paulo, o mais antigo grupamento jurídico do Estado, (fundado em 1874) elegeu duas profissionais muito qualificadas para presidente e vice-presidente (Maria Odete Duque Bertasi e Ivete Senise Ferreira) e lhes dará posse em janeiro próximo.
Justiça seja feita: em outros segmentos jurídicos a mulher tem aparecido em índices mais expressivos. Na Defensoria Pública cujo prestígio é crescente - nas Procuradorias, em todo o Brasil, contam-se às dezenas as profissionais, com as qualidades e defeitos dos seres humanos, sem consideração pelas diferenças do sexo. Antes se acreditava que os Estados do Norte-Nordeste eram mais machistas. Engano completo. Lá a compreensão de quanto é importante a participação feminina se espalhou e se consolidou facilmente. É o caminho do futuro, que já teria de ser plena realidade no presente, pelo espaço que ainda falta preencher por elas. Ellen Gracie está aí para confirmar.


Texto Anterior: Sem depor, pilotos do Legacy voltam aos EUA
Próximo Texto: Livros Jurídicos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.