São Paulo, domingo, 09 de dezembro de 2007

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Em Goianápolis, "todos" conhecem alguém que voltou

JOHANNA NUBLAT
ENVIADA ESPECIAL A GOIÁS

"Você é o Neto?" "Yes", responde João Neto Soares, 42, que chegou há 19 dias da Pensilvânia, nos Estados Unidos, após uma estadia de três anos e meio. Detalhe: o inglês de Neto é curto. "Sei me comunicar."
"O inglês de lá é diferente do que se fala aqui", diz. "Aqui", no caso, é a cidade de Goianápolis (GO), a 33 km de Goiânia.
A reportagem perguntou a cerca de 30 pessoas nas ruas de Goianápolis quem conhecia alguém que acabara de voltar dos EUA. Todos conheciam, pelo menos, duas pessoas. "Se for deportado, então, tem um monte", disse um transeunte.
Mas esse não é o caso de Neto, que voltou porque quis. "Na época valia a pena ir porque o dólar estava bem cotado. Agora, que está baixo, não compensa. Juntei dinheiro, mas, quando cheguei, já não valia mais nada, infelizmente. Só paguei as dívidas. Dez anos atrás era diferente", lamenta. Mesmo assim, não se diz arrependido.
Ele deixou Goianápolis e um emprego de compra e venda de carros. Lá, trabalhou em construção e cultivou o carinho do chefe, o único que teve nos três anos. "Só não fazia desmanche e carregar lixo; o resto era comigo", conta.
Além do dólar, o que puxou Neto de volta foi a saudade da família e dos costumes. "Lá você paga até para encher o pneu de ar. Aqui não, as pessoas te convidam para almoçar e tomar café", diz, oferecendo jabuticabas recém-colhidas.
A saudade da família também foi o que trouxe da Flórida Elimar Silva, 33, há três meses de volta a Goianápolis. "Ih, demais da conta. Você percebe que largou uma esmeralda para trás."
Ele entrou no país ilegalmente, pelo México. A idéia era "fazer um pezinho de vida", voltar e abrir um supermercado. Não deu certo. O dólar barato queimou suas economias, que ele terminou de gastar com a passagem de volta. Em vez do supermercado, ele trabalha na lavoura de tomate. E se diz feliz, diferente de quando estava lá.
"Quem não fala a língua é escravizado", diz Luciana Ferreira da Macena, 36. Hoje, ela mora em Goiânia, mas até outubro ela vivia com os dois filhos pequenos -sete e nove anos- em Nova York. Só agüentou ficar cinco meses, mesmo legalmente no país e falando bem inglês. A baixa do dólar foi definitiva.
Nair, mulher de Neto Soares, deixou de presenciar o casamento de duas filhas e o nascimento do primeiro neto, quando morava nos EUA.
Com a volta da avó, o netinho ganhou vários brinquedos. Ursos de pelúcia, caminhões e bonecos -e Nair não gastou um centavo americano. Recolheu tudo do lixo. E mostra com orgulho: os tapetes da casa vieram do mesmo lugar.


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