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Cem policiais, fuzis e helicóptero escoltam quadros até o Masp
Operação da Polícia Civil foi montada para transferir, da sede do Deic para o museu, as obras de arte recuperadas
Evento, celebrado com espumante nacional, reuniu o secretário da Segurança, o delegado-geral e representantes do Masp
LAURA CAPRIGLIONE
EVANDRO SPINELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O helicóptero preto da Polícia Civil dá um rasante sobre o
Masp. Por um momento, parece que pretende atravessar o
enorme vão livre do prédio. É o
sinal. São 10h55 e os mais de
cem policiais mobilizados para
a operação de devolução dos
quadros furtados começam a
chegar ao museu fincado na
avenida Paulista, vindos da sede do Deic (Departamento de
Investigações sobre o Crime
Organizado). Descem de motocicletas, de camburões (a reportagem contou 20) e até de
um caminhão militar -todos
com as sirenes ligadas.
Vêm armados com fuzis, metralhadoras e pistolas, aparato
que, garantem os policiais, visa
a garantir a segurança de um
caminhãozinho branco com a
preciosa carga: os quadros "Retrato de Suzanne Bloch", de Pablo Picasso (1881-1973) e "O Lavrador de Café", de Candido
Portinari (1903-1962).
Às 11h em ponto, sob aplausos, a carga sai do caminhão climatizado a 20C. Decepção geral: vem fechada em pacotões
de papelão e entra no museu.
Um clone de Bob Marley,
vendedor de artesanato, pede
aos gritos para abrir os embrulhos, mas é dissuadido de mais
protestos por um armário do
GER (Grupo Especial de Resgate da Polícia Civil), vestido com
camiseta preta justa e calça verde-militar. O fortão pede silêncio, o magrinho rasta obedece.
Musculatura
Tinha a turma do GER e a
turma do Garra (Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos), todos de preto, também
fortões. Era a elite da polícia
exibindo sua musculatura.
Logo depois, o auditório do
Masp foi aberto para a assinatura pública do auto de devolução das peças ao museu. Do lado direito do palco, em cavaletes, as obras roubadas, iluminadas por um feixe de luz fortíssima. Ocupando o restante do espaço, mais de 30 pessoas -conselheiros do museu, o presidente da instituição (arquiteto Julio Neves), o secretário da
Segurança Pública (Ronaldo
Marzagão), o delegado-geral
(Maurício Freire), membros do
GER, delegados, fuzis, pistolas
e metralhadoras.
Marzagão, o primeiro a discursar, chamou o evento de
"singela cerimônia". Neves, que
o secundou, disse que a segurança do museu está sendo modernizada graças a doações de
empresas, garantiu que cumprirá seu mandato até o fim
(em outubro), mas que não pretende se recandidatar, e que a
situação financeira do museu
está equacionada.
"É lamentável, às vezes, que
precise ocorrer uma tragédia
como essa [refere-se ao furto]
para a gente receber apoio, inclusive financeiro", afirmou.
Um grupo de conselheiros
ouvidos pela Folha confirmou
a informação. Segundo eles, a
dívida do museu é de cerca de
R$ 10 milhões. Outros R$ 4 milhões, devidos ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), estão sendo contestados.
O museu já conseguiu captar
cerca de R$ 4 milhões de um
total de R$ 8 milhões autorizados em novembro pelo Ministério da Cultura dentro da política de benefícios fiscais. E ainda há R$ 10 milhões que devem
ser destinados pelo governo federal à instituição. Ou seja, o
museu está capitalizado e deve
isso principalmente ao furto
das duas telas. O fato chamou a
atenção para a crise no Masp,
que acabou recebendo apoios.
"Deus escreve certo por linhas tortas", filosofou o presidente, que chamou o secretário
da Segurança para um brinde
comemorativo no saguão ao lado. Servidos espumante nacional Chandon e petit fours, deu-se um viva à polícia, que retribuiu levantando as taças. Eram
12h. As telas continuaram no
auditório, guardadas por três
homens de terno.
Segurança afrouxada, a turma de curiosos aproveitou para
subir ao palco e tirar fotos ao
lado das obras. Eunice Sophia,
coordenadora do acervo do
Masp, observava a movimentação, preocupada. Ela foi uma
das técnicas chamadas no final
da noite de terça ao Deic para
verificar o estado do Picasso e
do Portinari resgatados.
O Masp será reaberto amanhã, já com as duas telas de novo em exposição. Sophia propôs a Julio Neves que sigam no
mesmo local de antes do furto,
no segundo andar. "Nós nem
tiramos as ferragens de apoio,
estão lá esperando o retorno
desses filhos queridos."
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