São Paulo, sábado, 10 de março de 2001

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CRIANÇA

Oficial de projetos da Unicef diz que aprovar a medida é ir na contramão das propostas sérias de políticas de segurança

Redução da idade penal é criticada em evento em BH

ELAINE RESENDE
FREE-LANCE PARA A AGÊNCIA FOLHA,
EM BELO HORIZONTE


A possibilidade da redução da idade penal de 18 anos para 16 anos foi criticada ontem no Seminário Brasileiro de Crianças e Adolescentes Trabalhadores, que acontece em Belo Horizonte.
Lidja Maria do Nascimento Pereira,19, que já participou de quatro conferências internacionais sobre trabalho infantil, criticou as tentativas para mudar a lei.
Segundo ela, que é educadora social do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, "a redução permite que o governo não cumpra uma responsabilidade que é dele, já que o próprio governo não cria condições de vida digna para crianças e adolescentes".
O artigo 23 do Código Penal Brasileiro estabelece que todo jovem acima de 18 anos é penalmente responsável pelos seus crimes. Mas, com o aumento da violência em todo país, surgiram tentativas para reavaliar a lei. Hoje a Câmara de Deputados tem 14 projetos que tratam do assunto.
O relator da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) sobre a imputabilidade penal, deputado Inaldo Leitão (PSDB-PB), afirma que a "idade penal deve ser feita a partir de uma avaliação biopsicológica, e não biológica".
"Se um jovem de 16 ou 17 anos, que pode votar, cometer um crime eleitoral, não será punido por causa da lei", diz. O deputado acrescenta que "esse tipo de norma não compromete a ordem democrática e constitucional".
A deputada federal Nair Lobo (PMDB-GO) disse que "muitos psicólogos e psicanalistas consideram um jovem de 16 anos apto a responder criminalmente pelo delito cometido". Ela afirma que o acesso à informação é grande, "inclusive nas camadas mais pobres". "Por mim eu punha 12 anos. O jovem fala "sou de menor" e fica tudo por isso mesmo."
O artigo 112 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) diz que o adolescente infrator, apesar de ser penalmente inimputável, é convocado a se responsabilizar pela sua conduta, cumprindo medidas socioeducativas. Assim, o menor de 18 anos pode ser advertido, prestar serviços à comunidade ou cumprir a determinação do juiz em "internatos".
"Essa privação da liberdade deve acontecer em condições que possibilitem os objetivos de reintegrar, ressocializar e abrir espaços para recuperação", disse a advogada e socióloga Arabela Rota, que participou do seminário.
Para o coordenador nacional do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, Rodrigo Stumph González, a aprovação dessa proposta de emenda pelo Congresso só reforça o problema da criminalidade.
"Além de não haver mais vagas nos presídios, o sistema carcerário brasileiro diminui a possibilidade de reinserção desses jovens", diz. González afirma que os argumentos defendidos pelos favoráveis à redução da idade não se baseiam em dados estatísticos.
Em junho de 99, o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) realizou uma pesquisa em 6.413 unidades de privação de liberdade (as chamadas Febens) e chegou aos seguintes números: 66% cometeram crimes contra a propriedade ou o patrimônio; 21.5% contra a vida ou a integridade pessoal; 3.5% contra a liberdade sexual e 9% praticaram alguma transgressão referente ao uso ou porte de drogas.
"Aprovar essa medida é ir na contramão das propostas mais sérias de políticas de segurança pública", diz o oficial de projetos do Unicef, Mário Volpi.
O Seminário Brasileiro de Crianças e Adolescentes Trabalhadores vai terminar amanhã, com a redação de um documento final com as conclusões de cada grupo temático.


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