São Paulo, terça-feira, 10 de abril de 2001

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BELO HORIZONTE

Orientados por voluntários, 72% dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa deixam de cometer infrações

Programa ajuda jovem a não voltar ao crime

ELAINE RESENDE
FREE-LANCE PARA A AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

O trabalho de 230 voluntários em Belo Horizonte está ajudando a cidade a alcançar, de forma pioneira, um nível de sucesso na recuperação de jovens infratores considerado recorde.
Setenta e dois por cento dos adolescentes entre 12 e 18 anos que cumprem medidas socioeducativas determinadas pelo Juizado da Infância e da Juventude da capital mineira não retornaram ao crime desde que o projeto foi implantado, em 1997.
Os voluntários, chamados de orientadores, fazem parte do programa Liberdade Assistida, implantado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, em parceria com o Juizado da Infância e da Juventude e a Pastoral do Menor. Em três anos, 941 jovens já passaram pelo projeto.
C.D.F., 18, participa do programa desde julho do ano passado, depois de ter cometido um assalto à mão armada. Ele é orientado pelo dentista Cláudio Manoel de Meireles, 50, que há 20 anos dedica parte de seu tempo a quem necessita de assistência.
O jovem afirma que conversar com uma pessoa "mais experiente e competente" ajuda a perceber outras vivências e a aprender com elas. Depois de fazer um curso de serralheiro, ele conseguiu um emprego, pelo qual recebe R$ 250,00 por mês. Está também cursando o segundo ano científico.
Ele reconhece que a presença do voluntário contribui para seu desenvolvimento. "Quando a gente não tem alguém para conversar, para dar carinho, a gente só pensa em maldade", diz.
Meireles afirma que não existe uma fórmula para atender esses adolescentes, já que cada caso merece uma orientação diferente. "Quando o indivíduo é sacado do meio criminoso e muda de ambiente, ele passa a comparar valores e a mudar, além de se sentir realmente parte da sociedade", afirmou Meireles.
A função do orientador é examinar cuidadosamente as situações que levaram esses jovens à prática do crime e guiá-los para um caminho melhor.
As reuniões acontecem esporadicamente e o voluntário "cuida" do menor durante um período mínimo de seis meses. Os adolescentes também se encontram com os técnicos da Prefeitura de Belo Horizonte, que avaliam se eles estão realmente cumprindo o que foi determinado pelo Juizado, que recebe boletins bimestrais sobre cada caso.
"Cabe ao voluntário estimular a descoberta de novos valores, o resgate da dignidade e a conquista de horizontes ainda mais amplos na vida", afirma a gerente de medidas socioeducativas da Prefeitura de Belo Horizonte, Carla Machado de Castro.
A parceria é pioneira no Brasil. Carla acredita que os bons resultados se devem, em muito, ao apoio dos voluntários. A gerente cita o caso de uma voluntária que alfabetizou um rapaz de 16 anos por conta própria.
Outro voluntário realizou o sonho de um adolescente admirador de música: levou o garoto para um concerto. "O orientador tem um olhar individual em relação ao adolescente, o que o poder público não tem como fazer", afirma Carla.

Decisão judicial
O juiz da Vara da Infância e da Juventude de Belo Horizonte,Tarcísio José Martins Costa, diz que o êxito do programa também se deve ao cumprimento imediato da decisão judicial, que é monitorada pelos voluntários.
O programa conquistou, em 99, o prêmio Socioeducando, criado por entidades que lidam com a questão da criança e do adolescente, como o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância).
Segundo a secretária-executiva do prêmio, Karina Spozato, a experiência de Belo Horizonte é a de maior destaque no país.
"É eficaz, por atingir esse número expressivo, e criativa, já que é o único projeto nacional que conseguiu reunir órgão público, igreja, Justiça e comunidade", afirma Karina Spozato.
Segundo dados do Ministério da Justiça de 1998, 26% dos Estados não possuem nenhum programa de liberdade assistida.
O programa também se mostra eficiente para as contas da cidade. A prefeitura gasta, por mês, R$ 80 para cada adolescente. Já nos casos de internação, são aplicados R$ 1.300 mensais por jovem.
Faltam, no entanto, voluntários. Atualmente o programa tem 380 jovens inscritos e 230 orientadores. Os interessados em participar do Liberdade Assistida podem ligar para 0/xx/31/3277-4578.



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