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MOACYR SCLIAR
A prova do amor
"Amor é detectável por meio de tomografia, dizem pesquisadores britânicos."
Ciência, 6.jul.2000
Quando é que nós vamos
casar, perguntava ela, impaciente -e não sem alguma razão: estavam juntos havia cinco
anos, e o namorado não se decidia. E não se decidia, segundo alegava, por uma boa razão: não sabia ao certo se a amava. Na verdade, não sabia exatamente o
que era amor. Sim, com ela era
bom na cama e tudo o mais
-mas seria amor mesmo aquilo?
Como se comprova objetivamente o amor?
A moça não estava disposta a
continuar essa discussão, para ela
bizantina. Deu-lhe um ultimato:
que resolvesse de uma vez se a
amava ou não. O que o deixou
consternado. Pensou até em procurar um terapeuta, mas sabia
que esse tipo de tratamento não é
eficaz a curto prazo. Foi então
que leu no jornal a notícia sobre o
trabalho dos pesquisadores ingleses. Sim, ali estava a solução para
seu problema.
Por meio de um amigo médico,
fez contato com os cientistas, oferecendo-se como cobaia. Para sua
alegria, eles o aceitaram. E assim,
sem nada dizer à namorada, ele
tomou o avião e foi para Londres.
O teste foi muito simples. Pediram-lhe que olhasse durante alguns minutos a foto da namorada, que trouxera consigo. Depois
disto, fariam uma tomografia para avaliar a atividade cerebral em
uma certa área que eles, espirituosamente, denominavam
"área do amor". Pediram só algum tempo para discutirem os
achados: não queriam cometer
erros.
No dia seguinte lá estava ele,
ansioso. O cientista que o recebera veio a seu encontro, sorridente:
nunca tinham visto tanta atividade na área do amor. O seu cérebro, concluiu, é o retrato da paixão.
Agora seguro quanto a seus sentimentos, ele voltou para o Brasil.
Na semana seguinte, casou.
De maneira geral, pode-se dizer
que é feliz. Mas às vezes briga com
a mulher, às vezes fica com o saco
cheio do casamento. E é então
que uma dúvida lhe ocorre, uma
dúvida cruel para a qual ele não
tem resposta, ou não quer encontrar resposta: e se tivessem trocado a tomografia?
O escritor Moacyr Scliar escreve nesta
coluna, às segundas-feiras, um texto de
ficção baseado em matérias publicadas
no jornal.
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