São Paulo, quarta-feira, 10 de julho de 2002

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URBANIDADE

Jardim dos gays

Vincenzo Scarpellini
LINHAS BRANCAS A diferença entre uma obra arquitetônica e um monumento é o espaço interno: podemos rodear um obelisco, mas não entrar nele. O terminal da praça do Patriarca, de Paulo Mendes da Rocha, surge entre as duas construções. Reorganiza as proporções dos edifícios, ativa a fachada da igreja, faz da praça uma espécie de grande sala e, ainda, contém seu próprio espaço interno (VINCENZO SCARPELLINI)

GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

Na busca de aventura, Roberto Lima, de 22 anos, preparador de refeições para aviões, prefere o parque Siqueira Campos, mais conhecido como Trianon. "É um point de caça", define. Mas não é um território liberado: "Dois homens de mãos dadas correm o risco de sofrer repressão policial."
Numa cidade em que os homossexuais fazem as maiores manifestações públicas (bem maiores que as do Dia do Trabalhador), eles ainda não conseguiram uma área pública onde não se sintam ameaçados ou constrangidamente tolerados. Se depender de Stela Goldenstein, secretária municipal do Meio Ambiente, os gays terão direito ainda este ano a um jardim no Ibirapuera.
Stela decidiu lançar uma batalha contra o Detran (Departamento Estadual de Trânsito), que abocanhou um naco do Ibirapuera e fez dali um estacionamento. Essa área, protegida por tapumes, acabou entrando no roteiro dos "points de caça" e de prostituição masculina.
A idéia é oficializar a área como um ponto de encontro homossexual, mas revitalizado. Arquitetos, decoradores e paisagistas seriam convidados a entrar num concurso para o projeto. O plano corre, porém, o risco de resistência. Vizinhos do Ibirapuera, os moradores do Jardim Lusitânia pressionam, há anos, as autoridades para que expulsem os gays dali.
Para amenizar as pressões dos vizinhos e não se criarem restrições aos frequentadores do parque, Stela quer fazer parceria com uma entidade de defesa dos homens homossexuais, que ajudaria a fazer um pacto de conduta. Inspirado na experiência com prostitutas da praça da Luz, o pacto proibiria a prática de sexo em público ou nas redondezas, a circulação de cafetões e qualquer atitude ofensiva.
Não vai ser fácil a idéia sair do papel, apesar da simpatia da prefeita Marta Suplicy. Há muitas pessoas influentes no Judiciário que vivem no Jardim Lusitânia, o Detran terá de devolver o terreno (que não lhe pertence) e as verbas para o jardim dependem ainda de um patrocínio -não é sempre que se encontra uma empresa tão aberta culturalmente a ponto de associar seu nome a esse tipo de iniciativa.
Apoio, em tese, não falta: bastaria que cada uma das 600 mil pessoas que foram neste ano à Parada Gay doassem uma moeda de 25 centavos para que se arrecadassem R$ 150 mil, suficiente para fazer do estacionamento o primeiro jardim gay do Brasil.

E-mail - gdimen@uol.com.br



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