São Paulo, sábado, 10 de agosto de 2002

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LETRAS JURÍDICAS

Uma vida para o bem comum

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

Na próxima quinta-feira, dia 15, fará cem anos da morte, aos 93 anos de idade, de Joaquim Ignácio Ramalho, Barão de Ramalho, o mesmo Conselheiro Ramalho, da rua da Bela Vista, em São Paulo. Uma pessoa que, apesar do nome na via pública, é relativamente desconhecida para o paulistano. Todavia, notabilizou-se em muitos campos da vida. Bastam uns poucos exemplos para o leitor compreender porque esta coluna se antecipa às homenagens que serão prestadas a Ramalho.
Nasceu em 1809, um ano depois da chegada da família real portuguesa ao Brasil, que escapava das tropas de Napoleão. Seus pais não eram casados. O registro, nos livros paroquiais da Igreja, não era aceito, ao tempo. Foi adotado pelos Ramalho. Formou-se em direito e já no quinto ano, tais as qualidades que demonstrara, dava aulas ao primeiro ano. Pouco tempo depois de formado, ingressou na carreira do magistério. Concursou-se, foi professor e diretor da escola, depois Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, criada em 1827, na qual começaram os cursos jurídicos de nosso país. Durante seu período como diretor formou-se, também há um século, a primeira mulher advogada do Brasil, Maria Augusta Saraiva, em maio de 1902, três meses antes da morte do Barão de Ramalho.
Presidiu a Câmara Municipal (que, ao tempo, tinha poderes de Executivo) por três vezes. Fundador da Loja Maçônica Piratininga, foi seu venerável durante 45 anos. Foi presidente da Província de Goiás e deputado imperial.
Escreveu "Praxe Brasileira", o mais importante livro sobre processo civil até a adoção do Código Nacional em 1939, juntamente com trabalho de Paula Baptista, da Faculdade de Direito de Olinda. Coube-lhe a tarefa de terminar a construção do Museu do Ipiranga, no bairro do mesmo nome em São Paulo, próximo ao local em que Dom Pedro proclamou a Independência. O próprio Dom Pedro havia determinado a construção, junto ao riacho do Ipiranga. Anos mais tarde, a Câmara Municipal quis, sem êxito, mudar a obra para perto do colégio dos jesuítas, pois o Ipiranga ficava muito longe, em lugar de difícil acesso. Passaram-se os decênios. Inúmeras campanhas foram feitas junto à população, para levantamento de fundos. Fundos que desapareceram, sem destino conhecido. Somente depois de ser entregue a Ramalho a presidência da Comissão de Construção, os trabalhos chegaram ao fim, passados quase 70 anos de verbas que surgiam e desapareciam.
Teve, ainda, tempo para empolgar-se na libertação dos escravos. Fundou e presidiu, em 1874, o Instituto dos Advogados de São Paulo, tarefa em que teve a companhia de gente cujos nomes são ruas desta Capital: Américo Brasiliense, Antonio Carlos Ribeiro de Andrade, Martim Francisco de Andrada e Silva, João Monteiro, Rubino de Oliveira e muitos outros.
Poucas vezes vi tanta capacidade num cidadão, quanto a dele. O Instituto dos Advogados de São Paulo, a Academia de Direito do Largo de São Francisco e a Loja Maçônica Piratininga (os restos mortais de Ramalho repousam no mausoléu maçônico no cemitério da Consolação) lhe prestarão várias homenagens. O Instituto dos Advogados, presidido pelo Dr. Nelson Kojranski e a Editora Saraiva, uniram-se para patrocinar a edição do livro "Ramalho: uma vida para o bem comum", que escrevi em homenagem a esse homem extraordinário. Valeu a pena.



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