São Paulo, quinta-feira, 10 de outubro de 2002

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SAÚDE

Se todas as mães portadoras do vírus recebessem tratamento, taxa de risco de contaminação do bebê cairia para 2%

AZT não chega a 66% das grávidas com HIV

Tuca Vieira/Folha Imagem
A pediatra Elza Branco Padrão afirma que há desinformação sobre necessidade de teste de HIV


AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Das cerca de 17.200 mulheres com HIV que deram à luz em 2001 no Brasil, 11.300 fizeram o parto sem saber que tinham o vírus. Muitas ainda não sabem.
As desinformadas representam 66% ou dois terços das grávidas com HIV. Se soubessem, elas e os bebês poderiam ser medicados, reduzindo de 28% para 8% o risco de transmissão vertical. Se tivessem feito cesárea eletiva, indicada nesses casos, e recebido o "coquetel" de drogas já disponível na rede pública, o risco seria de 2%.
Por esses cálculos, se todas as grávidas com HIV tivessem sido identificadas e tratadas, o número de bebês em risco de contaminação teria caído no ano passado de 4.800 para 344.
Esse cenário de "doenças e mortes evitáveis" levou o Ministério da Saúde a investir em um programa que batizou de Projeto Nascer, que ainda será anunciado, mas cujos treinamentos já se iniciaram.
Outra boa notícia é o aumento no número de consultas de pré-natal, que passou de 3,4 milhões em 1995 para 10,2 milhões em 2001. A média de consultas por gestante passou de 1,2 para 4,2.
"A qualidade desse pré-natal é que precisa ser melhorada", diz Marinella Della Negra, responsável pelo serviço de Aids pediátrico do Hospital Emílio Ribas.
A qualidade do pré-natal afeta os cerca de 2,8 milhões de mulheres que dão à luz no sistema público de saúde por ano.
Uma pesquisa realizada em 1998 em três cidades paulistas -São Paulo, Santos e São José do Rio Preto- revela que 18% das mulheres que tinham HIV e que não sabiam passaram pelas consultas do pré-natal sem que sugerissem a elas o teste de Aids.
Dois anos antes, 1996, o medicamento AZT -tratamento para a mãe e o bebê- já era oferecido na rede pública e o médicos já sabiam da sua importância.
Nas maternidades municipais de São Paulo, 25% das mulheres que entram para dar à luz chegam sem resultado do teste HIV. "Ou não fizeram o exame, ou perderam o resultado, ou não quiseram mostrá-lo", diz Orival Silva Silveira, coordenador de assistência do programa de DST/Aids da Prefeitura de São Paulo.
Se a gestante não fez o teste de HIV, é porque o médico não sugeriu ou, se sugeriu, não foi convincente o bastante. Uma portaria de 2000 do Conselho Regional de Medicina obriga o médico a sugerir à gestante que faça o teste. Caso não concorde, ela terá que assinar um documento, isentando o médico dessa responsabilidade.
"As mulheres não costumam se negar a fazer o exame", diz Elza Maria Branco Padrão, pediatra do Serviço Ambulatorial Especializado Herbert de Souza, o "SAE Betinho" da prefeitura, em Sapopemba, zona leste.
"Mas há mulheres que não são informadas como deveriam, e há aquelas que têm medo de ser discriminadas, temem não conseguir um leito na hora do parto." A médica relata casos de gestantes que não fizeram o exame ou abandonaram o pré-natal por falta de dinheiro para o ônibus.
Nas maternidades que atendem convênios e pacientes particulares, o número de gestantes que chegam sem o teste de HIV seria maior. "Ainda há médicos que não sugerem às pacientes que façam o teste", diz Marinella.
Um infectologista que atende clientes de classe média e alta em São Paulo relata o caso de uma paciente que morreu de Aids logo após o parto sem saber que estava infectada.



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