São Paulo, domingo, 10 de novembro de 2002

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RETRATOS DO BRASIL

Veículo, que tem consultórios e centro cirúrgico, atendeu 29 municípios paulistas e mineiros neste ano

Ônibus-hospital descobre câncer em SP

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Sábado, 9h da manhã, município de Olímpia (434 km de SP). Uma fila de 120 pessoas -homens e mulheres-, se forma diante de um ônibus. Pela ordem de chegada, cada morador é examinado por médicos e enfermeiros no interior do veículo, que funciona como um mini-hospital, com salas de coleta de exames, consultórios e centro cirúrgico.
Há oito meses, sempre aos sábados, o ônibus percorre a região levando a bordo uma equipe médica que faz exames preventivos gratuitamente para quatro tipos de câncer: pele, boca, próstata e colo do útero.
O veículo faz parte do programa "Prevenção de Câncer Itinerante", desenvolvido pelo Hospital de Câncer de Barretos (a 424 km de São Paulo) e já esteve em 29 municípios de São Paulo e Minas Gerais. Um total de 2.575 pessoas foram examinadas, sendo que 64 tinham algum tipo de câncer.
O de pele foi o mais frequente, com 57 casos confirmados em um total de 880 exames. Esse tipo de câncer é o mais comum na população brasileira, com a ocorrência de 62 mil casos novos por ano, segundo o Ministério da Saúde.
A maioria dos tumores, 95%, provoca baixa mortalidade, mas se não-diagnosticados precocemente causam deformações e infiltrações de músculo e osso, deixando sequelas estéticas.
Um dos casos confirmados em Olímpia foi o do aposentado Antônio Raimundo, 68, que tinha uma lesão no antebraço e a tratava, por orientação de um médico, com remédios para micose. No ônibus, depois de fazer uma biopsia, descobriu que o ferimento era câncer de pele. "Fiquei sem saber em quem acreditar", diz ele. Na mesma consulta, fez o exame de próstata. Deu negativo.
Outros cinco homens da região não tiveram a mesma sorte. O aposentado Aparecido Nunes Duarte, 73, de Urânia (595 de SP) aproveitou a visita do ônibus na sua cidade e fez, pela primeira vez, um exame de próstata. O teste de PSA deu positivo e Duarte iniciou a radioterapia, associado a um tratamento quimioterápico.
"Sou o primeiro a aconselhar meus colegas a fazerem o exame", afirma Duarte, comentando que muitos amigos ainda se sentem constrangidos com o toque retal.
O câncer de próstata é o segundo mais comum na população masculina -o primeiro é o de pele. O Ministério da Saúde estima que 2002 fechará com 25,6 mil novos casos da doença. O grande problema é que apenas 30% dos casos desse tipo de câncer são diagnosticados precocemente. Nos mais avançados, só 31% dos pacientes permanecem vivos cinco anos após o diagnóstico.
Durante as visitas com o ônibus, a equipe médica de Barretos registrou ainda um paciente com câncer de reto e outro de boca.

Projeto itinerante
Segundo Edmundo Carvalho Mauad, diretor técnico do Hospital do Câncer de Barretos, os pacientes que tiveram exames com resultados alterados são encaminhados ao hospital.
Ele afirma que, antes levar o ônibus à uma determinada cidade, os responsáveis pela saúde do município são orientados a selecionar a população mais carente e a dar preferência às mulheres que nunca fizeram o exame papanicolaou para diagnóstico de câncer de colo uterino.
Para identificação de câncer de próstata, são selecionados pacientes acima do 50 anos.
Segundo ele, o projeto visa alertar a comunidade de saúde, e a população em geral, que o câncer pode ser curado se diagnosticado precocemente. Além disso, Mauad afirma que a população dos pequenos municípios dificilmente tem acesso a profissionais especializados em oncologia.
"É um projeto que deveria ser estendido a todo país. Todos saem ganhando com o diagnóstico precoce do câncer: o paciente, que tem aumentada a chance de cura, e o governo, que economizaria em internação e tratamento da doença", afirma.


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