São Paulo, quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

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entrevista

"Nem todo mundo pode ser médico", diz conselheiro

MARIANA BARROS
DA REPORTAGEM LOCAL

Nos últimos anos, embora a medicina tenha se tornado mais eficiente, ela tem perdido o seu caráter humanista.
A opinião é de Bráulio Luna Filho, coordenador do exame do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) e livre-docente da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Para ele, o que diferencia um bom médico de um médico comum não é o conhecimento técnico, mas a relação com o paciente. Ele acredita ainda que "não é todo mundo que pode ser médico".
Na opinião de Luna Filho, a UEL agiu certo ao decidir suspender a formatura dos alunos que invadiram o hospital universitário.

 

FOLHA - Como o sr. avalia o comportamento dos estudantes?
BRÁULIO LUNA FILHO
- É lamentável. A profissão médica é uma profissão cuja essência é uma relação humanista. E, nos últimos anos, embora a medicina tenha se tornado mais eficiente, ela tem perdido esse caráter. O que diferencia um bom médico de um médico comum não é o conhecimento técnico, mas a relação com o paciente.

FOLHA - Essa distância é uma questão tecnológica ou educacional?
LUNA FILHO
- As duas coisas.
Os alunos são cada vez mais científicos na sua abordagem, em detrimento da relação com o paciente. Cerca de pelo menos 30% da cura ou do cuidado dependem da empatia [entre médico e paciente]. Temos de reumanizar o curso médico. Está muito técnico, e isso influencia a prática médica.

FOLHA - Como corrigir?
LUNA FILHO
- Na seleção, é preciso ter uma melhor avaliação. Acredito também que durante o curso é preciso que ele tenha acesso a esse tipo de discussão. Esses indivíduos que vão fazer medicina têm de ter uma qualidade ética que não pode ser qualquer coisa. Eles vão lidar com o íntimo das pessoas.
Não quero externar nenhum pensamento preconceituoso, mas não é todo mundo que pode ser médico.

FOLHA - O que pode ser feito em relação a esses alunos?
LUNA FILHO
- Nunca é tarde para receber uma boa lição. Acho que a faculdade tomou
uma boa decisão de suspender a graduação, de fazer um processo de avaliação desses alunos. Não é o comportamento que a sociedade espera de um médico.

FOLHA - Por estresse profissional, estudantes de medicina têm maior necessidade de extravasar?
LUNA FILHO
- Há evidências que mostram que alunos de medicina bebem muito. São trabalhos publicados pela faculdade Santo Amaro há alguns anos e, mais recentemente, na Unifesp. É preciso trabalhar isso. Os trotes [de medicina] eram muito agressivos, houve toda uma preocupação e isso diminuiu.

FOLHA - Quais os principais problemas dos cursos médicos no Brasil?
LUNA FILHO
- O currículo é desatualizado, as turmas são grandes. Essas escolas não têm hospitais ou esses hospitais são de má qualidade para a educação, não são estruturados para receber e ensinar os alunos. E na maioria das escolas há professores contratados por tempo parcial.


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