São Paulo, domingo, 11 de abril de 2010

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Mecânico "comemora" 13 anos de morte

Luiz Henrique Bayma teve a morte forjada em abril de 1997; segundo ele, pela ex-mulher, que buscava pensão vitalícia

O morador de Belém só descobriu sua situação quando foi ao Maranhão em busca de uma segunda via da certidão de casamento


Tarso Sarraf/Folha Imagem
Luís Bayma mostra seu atestado de óbito feito em abril de 1997; ação que pede anulação do papel ainda não foi apreciada pela Justiça

JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM

Luís Henrique Bayma vai comemorar no próximo dia 22 o aniversário de 13 anos de sua morte -"natural" e "sem assistência médica", segundo o atestado de óbito que o mecânico, de 48 anos e bem saudável, guarda em sua casa em Belém.
Bayma, que apelidou a si próprio de "fantasma", acredita que sua morte foi forjada pela ex-mulher, com quem tem três filhos, para que ela recebesse pensão vitalícia. Um defensor público abriu para ele uma ação -ainda não apreciada- para anular o atestado de óbito.
No futuro desenrolar do processo, deve reencontrar numa audiência a ex-mulher, a quem não vê desde a separação, em 1995. A ex terá de levar três testemunhas dizendo que ele morreu. Bayma levará as dele.
O mecânico só descobriu que era um "morto-vivo" em 2004, quando saiu do Pará em direção a Codó (MA), onde nasceu, para conseguir a segunda via de sua certidão de casamento.
O documento, exigido para a inscrição num curso supletivo, não fora encontrado em uma repartição pública paraense.
Semanas antes, Bayma também não havia conseguido localizar seu cadastro de seguro-desemprego. Estranhou a coincidência, mas achou que fossem apenas dois enganos.
A sensação ruim começou a se tornar real no cartório de registro civil de Codó, onde, antes de pegar o documento, foi encaminhado à juíza de paz.
Ela o encarou, com ar grave, e pronunciou uma espécie de sentença de morte tardia.
"Rapaz, a tua mulher te matou. Tem que ter paciência, porque você não existe mais, e seu documento daqui para a frente é o atestado de óbito."
Lendo o atestado de óbito, Bayma ficou sabendo que, para o Estado brasileiro, era um cadáver, morto em 22 de abril de 1997, num bairro chamado "Invasão Criminosa", em Imperatriz (MA), de "causas naturais".
A teoria da juíza era que a ex-mulher -em conluio com um médico (que assinou o atestado), uma funerária (que confirmou ter feito o enterro) e um funcionário do INSS- havia "assassinado" Bayma para conseguir a pensão vitalícia.
"É uma máfia, mas ela fez isso por pura maldade", disse a juíza. Bayma concorda, mas vê na ganância de uma "mulher que casou por dinheiro" o real motivo para a "sacanagem".
Ele diz que é atormentado pela saudade dos filhos, com quem perdeu o contato.
Com uma renda máxima mensal de R$ 900, ganha consertando fogões, Bayma diz que quase não enfrenta problemas pela condição de cadáver ambulante -afora não poder ter a carteira de trabalho assinada.
A morte, afirma ele, tem sido uma época feliz: conseguiu terminar o ensino médio, leu seis vezes a Bíblia e se tornou um personagem conhecido na propaganda política no Pará.
Nas duas últimas eleições, o PT chamou Bayma para cantar na TV e no rádio um poema seu, elogiando o programa, implantado por petistas, no qual estudou. Nos versos, diz: "Minha vida é engraçada / mas parece tirania / pois sempre que me alegro / sou posto na enxovia [masmorra, calabouço]".


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