São Paulo, domingo, 11 de abril de 2010

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Ataque no Rio expõe guerra por caça-níquel

Carro em que estava o bicheiro Rogério Andrade foi alvo de bomba na quinta; na ação, ele ficou ferido e seu filho, de 17 anos, morreu

PM que tem ligação com a contravenção, segundo a polícia, sofreu atentado nos mesmos moldes em outubro do ano passado


RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO

Uma bomba explode no carro de um poderoso integrante da máfia e mata o motorista, na Sicília. O verdadeiro alvo, Michael Corleone, porém, não foi atingido; morre sua mulher italiana, a siciliana Apollonia.
Uma cena semelhante à do filme "O Poderoso Chefão" aconteceu em plena tarde de quinta-feira, no Recreio dos Bandeirantes, zona oeste do Rio. O Toyota Corolla blindado que explodiu era do contraventor Rogério Andrade, provável objetivo do atentado.
Mas naquele momento quem dirigia o carro era seu filho, Diogo, 17, que morreu na hora. O corpo do rapaz foi destroçado pela explosão, que destruiu completamente o automóvel e também feriu o rosto do pai, fora de risco de morte. O explosivo teria sido colocado sob o banco do motorista.
Não foi o primeiro atentado a bomba nesses moldes no Rio, com a explosão sob o motorista. Em outubro, o sargento da PM Rony Lessa teve uma perna arrancada e a Hilux blindada destruída em uma explosão. A polícia apura se o autor do crime -o detentor da "tecnologia operacional"- é o mesmo. Lessa também é ligado à contravenção, de acordo com a polícia. A Folha não o localizou para comentar a acusação.
A ação de quinta-feira foi um dos mais impressionantes capítulos da guerra pelo controle dos caça-níqueis na zona oeste do Rio, que já resultou em mais de 50 assassinatos e tentativas de homicídio desde o início, no fim dos anos 90.

Disputa na família
Ao contrário de outras guerras de máfia, entre diferentes famílias, esta é uma disputa entre inimigos familiares. O motivo é o espólio de jogo do bicho e máquinas de caça-níqueis de Castor de Andrade, integrante da cúpula da contravenção do Rio, morto em 1997.
Os dois protagonistas da disputa no Rio são Rogério Andrade, sobrinho do patrono, e Fernando Iggnácio, seu genro, casado com a filha Carmen Lúcia.
Na partilha de Castor, dividiu-se o negócio principal entre o filho, Paulinho, o sobrinho Rogério -que cuidariam do jogo do bicho- e o genro, Fernando Iggnácio, um dos pioneiros das máquinas caça-níqueis no Rio. No ano seguinte à morte do "capo", seu filho Paulinho foi morto a tiros.
Rogério Andrade foi condenado, como mandante, a 19 anos e 11 meses de prisão, mas o julgamento foi anulado, e novo júri está marcado para agosto. Nesse meio-tempo, foi preso, mas obteve habeas corpus.
Assumindo os negócios deixados por Paulinho, Rogério passou a disputar com Fernando Iggnácio a hegemonia da exploração da contravenção na zona oeste, passando a explorar também as máquinas caça-níqueis, arrendando a área para máquinas alheias.
Houve mortes, destruição de máquinas de lado a lado e tentativas de homicídio.
Em 2001, Rogério disse ter escapado de uma tentativa de assassinato quando um militar da reserva invadiu um apart-hotel onde estava, mas a arma falhou. O celular do pistoleiro tinha registros do telefone de Iggnácio, apontado como o mandante. Policiais desconfiam de que tenha sido uma armação para incriminar o rival.
Nessas guerras, o enredo inclui mortes, atentados, dinheiro e proteção de policiais.
Os dois inimigos sempre contaram com a segurança de dezenas de policiais civis e militares. A operação Gladiador, da Polícia Federal, prendeu em 2006 PMs e policiais civis que davam proteção à contravenção. O ex-chefe de Polícia Civil Álvaro Lins foi apontado como "chefe da quadrilha" pela PF, ao lado dos "Inhos", grupo de agentes de sua confiança com os apelidos no diminutivo.
Rogério e Iggnácio já tinham sido presos antes, no mesmo ano. Foram condenados no início do ano passado, mas soltos em março e junho.
No período de um mês, antes da operação, a PF flagrou nas escutas quatro assassinatos e dois atentados determinados por Iggnácio. A cada morte, Marcos Paulo Silva, o Marquinhos Sem Cérebro, ligava para o chefe e dizia: "bingo", avisando que a vítima estava morta.


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