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DANUZA LEÃO
Mudar tudo
Chegou às minhas mãos,
há muitos anos, um texto que me parece a perfeição, que fala de vida e de morte
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ÀS VEZES FICO PENSANDO que a
vida é muito malfeita. Então a
gente nasce, se afeiçoa às pessoas, e um dia elas desaparecem, assim, a troco de nada?
Como diz um amigo meu, as pessoas têm a mania de morrer, o que é
um péssimo hábito.
Não que se queira a vida eterna,
que poderia ser de um tédio cruel,
mas as pessoas são tão criativas
-Deus, sobretudo, que criou um
mundo tão incrível que até os políticos ele inventou, aliás não sei para
quê; talvez para dar assunto aos jornais. Mas bem que ele poderia inventar um final menos doloroso para a tal da vida, para que se sofra um
pouco menos os que morrem e os
que estão em volta.
Há quem acredite no inferno e no
purgatório, que seriam duas etapas
até chegar ao paraíso. Aliás, devo estar falando bobagem: será que quem
vai parar no inferno, se se comportar muito bem, tem chances de acabar no paraíso? As freiras se esqueceram de me ensinar isso, mas chegou às minhas mãos, há muitos
anos, um texto que me parece a perfeição, que fala de vida e de morte.
Não foi escrito por nenhuma autoridade do Vaticano, nem avalizado pelo Padre Eterno, mas que considero
uma perfeição.
Seu autor foi, segundo consta,
Charles Chaplin. Vamos a ele.
É um texto diferente de tudo o que
se costuma ler, e mesmo que você já
o conheça, lerá de novo com o mesmo prazer. O problema é: um colunista tem o direito de publicar um
texto que não seja seu, mesmo dando o crédito? Eu, por mim, acho que
sim, raramente, e só quando o texto
merece muito; como estou saindo
de férias, já estou com a cabeça lá
longe, por isso não conseguiria escrever nada nem parecido com esse
pequeno primor de que falei, tal a
sua genialidade.
Ele vai, então, como um presente
aos leitores. Na minha volta pretendo estar cheia de gás, pronta para recomeçar. Mas com a triste e melancólica sensação de que nunca seria
capaz de escrever nada de tão precioso quanto o texto de Chaplin.
Na minha opinião, trata-se de
uma pequena obra prima, e a genialidade é sempre digna de aplausos
-de pé. É um texto curto, como devem ser os melhores -e este é um
deles.
"A coisa mais injusta sobre a vida é como ela termina. Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás pra frente.
Nós deveríamos morrer primeiro, nos livrar logo disso. Daí viver num asilo, até
ser chutado pra fora de lá por estar muito novo, ganhar um relógio de ouro e ir
trabalhar. Então você trabalha 40 anos
até ficar novo o bastante para poder
aproveitar a sua aposentadoria.
Aí curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se
prepara para a faculdade. Vai para o colégio, tem várias namoradas, vira criança,
não tem nenhuma responsabilidade, se
torna um bebezinho de colo, volta pro
útero da mãe, passa seus últimos nove
meses de vida flutuando, e termina tudo
num grande orgasmo. Não seria perfeito?"
Charles Chaplin
danuza.leao@uol.com.br
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