|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Erros também prejudicam outros exames
Segundo os médicos, falhas vão desde a digitação incorreta de laudos até imagens confusas que dificultam o diagnóstico
Associação diz que é difícil contabilizar as queixas no Brasil porque os médicos, na dúvida, pedem que paciente repita o procedimento
DA REPORTAGEM LOCAL
No Brasil, não há dados sobre
a incidência dos erros em outros exames de imagem e de
análises clínicas, mas 15 médicos entrevistados pela Folha
afirmam que eles também são
freqüentes e vão desde a digitação errada de laudos até a elaboração de imagens confusas
que dificultam o diagnóstico.
Mais de 3.000 estudos europeus e americanos revelam que
o problema não é exclusivo do
Brasil. Um recente trabalho da
Universidade de Leiden (Holanda) com 800 mulheres com
tumor uterino revelou que
houve erro de interpretação
em 30% dos casos. Outro estudo do Hospital Saint Thomas,
de Londres, mostrou uma discordância de até 80% entre radiologistas que analisaram problemas da placenta de grávidas.
A própria AMB (Associação
Médica Brasileira) reconhece
que o problema é sério, mas
que, no Brasil, é difícil contabilizar as queixas porque os médicos, quando desconfiam do
resultado do exame, pedem para o paciente repeti-lo em outro laboratório de confiança.
"Não se anda com a queixa", resume o médico Aldemir Soares,
secretário da AMB.
Repetir os exames, segundo
os médicos, pode evitar problemas mais sérios. Nem sempre.
A ginecologista Cláudia Gazzo
conta o caso de uma paciente
idosa que, na primeira consulta, tinha um tumor na mama
"palpável".
Ao pedir a última mamografia da mulher, feita dois anos
antes, a médica percebeu que o
laudo assinalava um resultado
normal, embora a chapa mostrasse microcalficações agrupadas e de formatos diferentes,
situação que sugere um câncer
e que precisa ser avaliada com
biopsia. "Por essa falha, não foi
possível o diagnóstico precoce." A mulher retirou as mamas, mas acabou morrendo.
O obstetra Thomas Gollop,
da USP de São Paulo, também
coleciona casos de pacientes
que tiveram laudos de ultra-som indicando problemas na
placenta, que sugeriam sofrimento fetal -condição que pode levar à antecipação do parto-, e que chegaram assustadas ao consultório.
"Se a gente sabe que a paciente não tem diabetes, não é
hipertensa, tem volume de líquido amniótico adequado, logo desconfia da falha do exame
e a tranqüiliza." Mas ele reconhece que essas falhas podem
induzir médicos inexperientes
ou não-capacitados a adotar
condutas que podem colocar
em risco mãe e feto.
Para reduzir as chances de
erros, muitos médicos têm
aconselhado as pacientes a fazerem seus exames em serviços que conhecem. O mastologista José Luiz Bevilacqua, do
Hospital Sírio Libanês, é um
deles. "Só confio em dois laboratórios em São Paulo", diz ele,
que não quis mencionar os nomes por questões éticas.
O professor de ginecologia da
Unifesp (Universidade Federal
de São Paulo) Sérgio Mancini
Nicolau também encaminha as
pacientes para laboratórios
que têm profissionais "conhecidamente muito competentes" na área específica que precisa ser avaliada.
"Existem muitos profissionais assim em vários laboratórios diferentes e mesmo que
determinado laboratório seja
excelente, pode ser que o profissional que queremos esteja
em outro." Ele diz que os problemas que já teve se restringiram a falhas de digitação.
Na opinião de Aldemir Soares, há mais chances de erros
quando os laboratórios, por
contenção de custos, encolhem
os protocolos de segurança para tornar o processo mais rápido. "Por exemplo, como os convênios pagam pouco pelo exame, há tendência de usar menos contraste do que o recomendável. Isso leva a falhas
nos filmes", comenta.
Aliado a isso está a capacitação do profissional. Por força
de mercado, alguns centros radiológicos empregam mão-de-obra barata, ou seja, médicos
recém-formados, com pouca
experiência, para realizar e interpretar os exames.
Para Wilson Shcolnik, presidente da Sociedade Brasileira
de Patologia Clínica, hoje há
recursos seguros para monitorar e controlar todo o processo
de exames e a grande maioria
dos laboratórios já os utiliza.
Shcolnik afirma que a informatização diminui muito os erros
de digitação e de identificação
das amostras.
Na sua opinião, muitas das
alterações encontradas nos
exames são causadas porque o
paciente não fez o preparo correto recomendado -por exemplo, não respeitou o jejum ou a
recomendação de não tomar
bebida alcoólica nos dias anteriores ao exame- ou omite informações importantes, como
se está com gripe ou outra
doença infecciosa.
(CLÁUDIA COLLUCCI)
Texto Anterior: Erro na mamografia põe laudos em xeque Próximo Texto: Médico defende ultra-som para mamas densas Índice
|