São Paulo, Sábado, 11 de Setembro de 1999
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INFÂNCIA
Agenciadora denuncia envolvimento de padre, juiz, promotor, ex-prefeito e fazendeiros de Porto Calvo
Polícia investiga rede de prostituição juvenil que serviria elite de cidade de AL

Plinio Nicacio/Folha Imagem
A juíza Nirvana Vianna, que investiga rede de prostituição em Porto Calvo, Alagoas, dá entrevista protegida por policiais


ARI CIPOLA
da Agência Folha

O padre, o juiz, o promotor, um ex-prefeito e fazendeiros de Porto Calvo (AL) são alvos de investigação da polícia alagoana acusados de envolvimento com uma suposta rede de prostituição de garotas com idades entre 12 e 16 anos.
A investigação começou a partir do depoimento de Angela Raquel da Silva, 30, que confessou estar agenciando o trabalho de meninas para a elite de Porto Calvo.
O depoimento, ao qual a Agência Folha teve acesso, foi prestado há nove dias ao delegado da cidade, José Levino de Oliveira, e à juíza da comarca, Nirvana de Mello Viana, 32. Angela foi convocada a depor depois de ameaçar agredir a adolescente V.M.S., 14.
Na delegacia, a garota revelou sua ligação com a prostituição de adolescentes da cidade e denunciou o próprio pai que, segundo ela, a obrigava a ter relações sexuais com um fazendeiro local.
Ao depor, Angela, que foi ameaçada de morte após a revelação da rede e estava ontem sob proteção policial em um quartel da Polícia Militar de Maceió, disse que começou a se prostituir aos 12 anos.
Um de seus clientes era o padre da cidade, Expedido Barbosa, 70. "Quando fiz 16 anos, o padre disse que eu estava velha e me pediu para arrumar meninas mais jovens", disse no depoimento.
Angela disse que ganhava até R$ 30 por programa agenciado.
Ela afirmou também que o promotor Sérgio Simões e o juiz Luciano Américo Galvão, que foi transferido da cidade em abril passado, usavam o próprio fórum da cidade como "motel".
Segundo ela, os encontros promovidos por "gente importante" estavam ficando cada vez mais frequentes desde o final de 1998.
Em um deles, realizado na chácara do fazendeiro Moacir Breda, vários homens chegaram a levar seus filhos menores de 18 anos para terem iniciação sexual. "Até eu tive que ficar nua", disse.
Segundo o depoimento, o fazendeiro José Falcão obrigava as garotas a fazer sexo entre elas.
Angela revelou o nome de quatro adolescentes que trabalhavam para ela. Elas já prestaram depoimento e indicaram mais cinco garotas e quatro agenciadores. Os nomes são mantidos em sigilo.
Desde abril, quando assumiu, a juíza Nirvana Vianna fechou quatro casas noturnas que funcionavam como bordéis de adolescentes. As seis garotas encontradas nos bares fechados foram matriculadas em escolas da rede pública e deixaram a prostituição.
A juíza entrou anteontem com uma representação na Secretaria da Segurança do Estado contra o promotor Sérgio Simões, que a teria ameaçado de morte. A juíza e sua família estão protegidas por policiais militares.
"Apesar de a miséria ser grande, a maioria das meninas envolvidas mora com os pais, mas são seduzidas por uma roupa nova, um trocado. É o que elas dizem."
Angela Silva foi indiciada sob acusação de aliciamento de adolescentes e favorecimento à prostituição. Em caso de condenação, a pena máxima para os crimes é de cinco anos de reclusão.
Os chamados "usuários" da prostituição das adolescentes podem ser enquadrados, segundo o delegado Oliveira, em crime de corrupção de menores.
No entanto, só serão indiciados sob essa acusação caso os parentes das adolescentes façam denúncias formais contra eles.
Isso porque o crime de corrupção de menores depende de queixa para que o Estado, no caso representado pela Polícia Civil, promova o indiciamento.



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