São Paulo, Sábado, 11 de Setembro de 1999
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LETRAS JURÍDICAS

(In)dependência ou morte

WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas

Os temas que a Semana da Pátria proporciona ao trabalhador do direito sofrem influências de muitas áreas. Não é possível pensar o conceito de independência ou de seu oposto (dependência) sem examinar assuntos de economia, de política, de relações internacionais, de grupos de influência e de interesses comunitários.
Na atualidade, nenhuma nação é tão independente que não dependa de qualquer outra. Nem mesmo os Estados Unidos da América do Norte, a única superpotência do final de século, sobrevivem sem a participação de insumos, recursos e importações oriundos de outras partes do mundo, até mesmo do Brasil. A diferença está em que os Estados Unidos têm condição de assegurar sua soberania pela força e pelo sistema econômico. A pressão exercível pela grande nação do norte -sem o uso de armas, quando lhe convenha- torna peculiar o conceito de sua independência. A sujeição a fontes de subsistência vinda de fora é insignificante para o povo norte-americano.
O conceito jurídico essencial, relacionado com a (in)dependência é o da soberania, que passa atualmente por processo de reavaliação. Pensando em termos de Brasil, a contar da idéia inserida, no artigo 1º da Constituição, de que um de seus fundamentos consiste na soberania, é preciso reconhecer que não se trata de valor absoluto. Deve, porém, ser absoluto dentro de nossas fronteiras. O povo elege os governantes que, livremente, escolhe. O Judiciário julga, aqui, as questões que lhe são submetidas, segundo regras de competência estabelecidas na lei nacional. O Poder Legislativo discute e vota as leis segundo critérios de sua maioria parlamentar, determinando a ordem vigorante.

Apesar disso, contudo, a independência continua relativa. Partes dela são cedidas em tratados internacionais, em que se aceita submeter o exercício soberano da vontade brasileira a regras destinadas a compatibilizar o interesse comum de diversas nações.
O exemplo moderno mais palpável é o das companhias aéreas e dos vôos internacionais. O transporte aéreo no planeta é possibilitado pela permissão outorgada, com maior ou menor liberdade, para o tráfego de aeronaves de outros países sobre seu território. O critério essencial é o da reciprocidade. Suponhamos que a China não permita que algumas de suas áreas sejam sobrevoadas por aviões comerciais não-chineses. Os países aos quais essa proibição seja estendida podem e devem impor os mesmos limites para aviões chineses.
Nestes tempos de satélites, são poucas as nações com avanço tecnológico para os colocar em órbita. A estratosfera em que esses aparatos circulam ainda não teve regulamentação adequada. Só o futuro determinará as soluções práticas. Soluções que começaram, há séculos, com a navegação marítima, impondo restrições ao tráfego de navios em águas territoriais e no acesso aos portos, com variáveis em tempos de paz e de guerra.
Nos mercados comunitários, a cessão da independência é mais ampla. Mesmo no Mercosul, cuja tímida implantação ainda não chegou à plenitude, os quatro signatários do tratado de Assunção sacrificaram partes substanciais de sua independência, em benefício de objetivos conjuntos.
O caminho da modernidade, a ser seguido -gostemos ou não gostemos dele- abre novas alternativas. Merece avaliação particular no tumulto da globalização a necessidade brasileira de manter os característicos essenciais do Brasil como nação e de seu povo, com os valores, anseios, tendências e emoções que lhe são próprios, livres de todas as interferências, para a alternativa justa, da independência com vida.


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