|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
URBANIDADE
O prestígio de um pastel
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
Instalados no Mercado
Municipal, os imigrantes
portugueses Horácio Gabriel
Ferreira e sua esposa, Maria de
Deus, começavam a trabalhar de
madrugada. Na década de 40,
vendiam sanduíches de mortadela, pernil e calabresa. Ganharam fregueses fiéis e conseguiram atingir o sonho da maioria
dos imigrantes: dois filhos viraram "doutores".
Um deles, Horácio Ferreira,
formou-se em direito, pensou
abrir um escritório de advocacia, mas acabou brilhando mesmo por causa de um pastel. "A
cozinha é a minha paixão", conta Horácio, que, desde os 12
anos, ajudava os pais no Mercado Municipal.
Herdou o ponto dos pais -o
outro irmão seguiu a engenharia- e resolveu desenvolver a
receita de um pastel de bacalhau. O quitute conseguiu uma
proeza urbana: é disputado,
principalmente aos sábados, por
atores, apresentadores, políticos
e executivos, todos espremidos
entre carregadores e vendedores.
"Eu me orgulho de servir e agradar a tanta gente diferente", diz.
A proeza do pastel é atrair
"VIPs" para aquela região deteriorada. Esse tipo de clientela
habitualmente se satisfaz num
circuito gastronômico bem distante dali -nos Jardins, na Vila
Madalena ou na Vila Olímpia.
"É uma tristeza a deterioração
da região", lamenta Horácio, ex-morador da Mooca.
Apesar do sucesso que já obteve, o pastel ainda pode conseguir
muito mais notoriedade. É possível que venha a sair do ostracismo urbano. Com recursos internacionais que podem vir do
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a prefeitura quer fazer do Mercado Municipal, reformado, um novo pólo
gastronômico de São Paulo -e
atrair, ainda em maior número
e todos os dias, clientes mais sofisticados.
Planeja-se criar ali um espaço
de entretenimento, com novos
restaurantes e atividades culturais, em meio às especiarias do
"Mercadão", ponto de encontro
dos chefes de cozinha à procura
de sabores exóticos. Fazem parte
do projeto a recuperação do seu
entorno -técnicos da prefeitura
estão convencidos de que a barulhenta e suja zona cerealista,
com seu tumulto de caminhões,
se mudará para o Rodoanel- e
a recuperação do parque Dom
Pedro 2º. "A beleza ainda está
no Mercado e nos arredores, mas
está suja, poluída e esquecida",
diz Horácio.
E-mail - gdimen@uol.com.br
Texto Anterior: Motoristas continuam em greve Próximo Texto: Trânsito: Obra bloqueia faixa na ponte Eusébio Matoso Índice
|