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LETRAS JURÍDICAS
Falsificação documental contra o comércio de rua
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
Tenho a impressão de
que passou quase despercebida uma recente alteração de
Código Penal (lei nš 11.035) que
vai atingir os comerciantes e, em
particular, a vida dos atuadores
do comércio informal, nas grandes e pequenas cidades.
A nova lei atinge, entre outros
efeitos, mercadorias vendidas
nas ruas desacompanhadas de
documentação mercantil comprobatória de sua licitude e bens
de consumo havidos por contrabando ou receptação. Cláudio
Fonteles, procurador-geral da
República, disse que o Ministério
Público luta contra o crime organizado e não contra os "bagrinhos" do descaminho ou de delitos do comércio de rua, mas o
texto da nova legislação sugere
coisa diversa. A fatal atração das
câmaras de televisão pelas correrias de camelôs e marreteiros vai
inspirar muitas diligências.
Receptação é delito conhecido.
Seus praticantes usuais não têm
dúvida quanto ao enquadramento no artigo 180 do Código
Penal. Consiste em adquirir, receber, transportar, conduzir ou
ocultar, em proveito próprio ou
alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir, para que
terceiro, de boa fé, a adquira, receba ou oculte. A pena é de reclusão de um a quatro anos e multa.
Contrabando, o primo rico do
descaminho, também é conhecido, na forma definida pelo artigo 334 do Código Penal. Pode
"pegar" de um a quatro anos
quem importa ou exporta mercadoria proibida ou não faz, no
todo ou em parte, o pagamento
de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo
consumo de mercadorias.
A capitulação dos crimes relacionados com a falsidade de títulos e outros papéis públicos foi
ampliada. Explico melhor, a finalidade explícita da lei diz respeito à falsificação de papéis públicos (artigo 293 do Código):
antes se referia a selo postal, agora alude à falsificação de selo,
sem o adjetivo. Sujeita-se a pena
de dois a oito anos de reclusão e
multa não apenas quem usa os
papéis referidos, mas também
quem guarda, possui ou detém
qualquer deles. Cai no mesmo
enquadramento, quem importa,
exporta, adquire, vende, troca,
cede, empresta, guarda, fornece
ou restitui à circulação selo falsificado, destinado a controle tributário, no exercício de atividade comercial ou industrial, produto ou mercadoria. Enfim, a regra se aplica aos casos em que a
legislação tributária determina
a obrigatoriedade do controle.
Quem a desobedecer pode ser
condenado a quatro anos de reclusão.
Volto à primeira frase deste comentário para dizer que o novo
parágrafo quinto do artigo 293
parece destinado aos sacoleiros e
camelôs. Equipara a atividade
comercial (ou seja, sujeita à mesma punição), qualquer forma de
comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em vias,
praças ou outros logradouros
públicos e até mesmo em residências. Considerando que há
número indeterminado, mas
certamente grande, de pessoas
comuns do povo que, premidas
pelas circunstâncias da vida,
atuam como sacoleiras, marreteiros e camelôs (que para grande parte deles nada tem de criminosa), será sempre melhor
preferir o ganho menor, mas
com a atuação observando as
exigências da nova lei. Será modo de evitar aborrecimentos e
prejuízos. Eles conhecem, mais
que a maioria, certas pressões,
nem sempre lícitas, a que são
submetidos.
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