São Paulo, sábado, 12 de fevereiro de 2005

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SAÚDE

Fabricante de droga retirada do mercado teria tentado influenciar médicos nos EUA

Merck quis anular oposição ao Vioxx

BARRY MEIER
STEPHANIE SAUL
DO "NEW YORK TIMES"

Há momentos em que é necessário "neutralizar" a oposição, ou pelo menos era isso que alguns executivos do laboratório farmacêutico Merck pareciam acreditar. Em 1999, o novo antiinflamatório da empresa, o Vioxx, perdeu a corrida e chegou às drogarias dos EUA depois de um concorrente, o Celebra. A Merck aparentemente esperava que reumatologistas de fama nacional nos EUA, como Roy Altman, pudessem ajudá-la a recuperar terreno.
Em um jantar naquele ano, em Miami, um executivo da Merck perguntou a Altman o que seria preciso para obter seu apoio, e este respondeu que desejava realizar um teste clínico usando o Vioxx; mais tarde, a Merck ofereceu US$ 25 mil para financiar o projeto. "Mostre-me o dinheiro", era a anotação que constava ao lado do nome de Altman, em um memorando interno da Merck. O médico diz que essas não foram suas palavras, e nem sua intenção. E que a lista de medicamentos que costuma receitar não foi afetada.
A campanha de marketing da empresa era apenas uma parte de um projeto que ajudou a impulsionar as vendas anuais do Vioxx à casa dos US$ 2,5 bilhões, até que a droga fosse retirada do mercado em setembro passado, depois que se constatou que aumentava o risco de ataques cardíacos e derrames. Em comunicado, a Merck diz que seus programas de marketing visavam oferecer informações precisas sobre seus produtos.
Nos últimos meses, investigadores do governo norte-americano, comitês do Congresso e advogados de queixosos obtiveram milhares de documentos internos da Merck. Parte dos registros envolve médicos que a Merck estava tentando "neutralizar", enquanto outros descrevem atividades para influenciar médicos.
Nos documentos de "neutralização", funcionários da empresa identificaram médicos influentes, mas "problemáticos", que a companhia acreditava terem opinião negativa sobre o Vioxx, ou que eram vistos como partidários ativos do Celebra. Para conquistá-los, funcionários da Merck planejavam oferecer estímulos como testes clínicos, postos de consultoria ou verbas para pesquisas.
Em uma lista do laboratório aparecem os nomes de 36 médicos a serem neutralizados. Um nome da lista, o médico Ettlinger, de Tacoma, foi descrito como assessor de um conselho de formulação em uma seguradora que vinha sendo "pesadamente cortejado pela Searle e Pfizer". Na época, a Searle era a fabricante do Celebra, e a Pfizer ajudava a comercializar a droga. Um documento da Merck recomendava que o médico recebesse mais convites para palestras pagas. "Vamos mantê-lo ocupado", dizia o documento. O médico disse que faz palestras regularmente para laboratórios, o que jamais afetou a lista de medicamentos que receita, afirma.
Ainda segundo os documentos, um representante da Merck solicitou em 1999 que a empresa doasse US$ 25 mil à West Coast Sports Medicine Foundation, organização sem fins lucrativos fundada pelo médico Keith Feder, da Califórnia. Um representante de vendas da Merck alega no documento que o pagamento de US$ 25 mil à fundação era preciso para "manter a competitividade com a Searle". Em formulário solicitando o pagamento, esse representante definiu o "resultado/ retorno esperado do investimento" como "participação de 51% no mercado de COX-2 em 2000".
Feder disse que o dinheiro não tinha por objetivo influenciar sua lista de remédios e não o fez.
Outro lado
A Merck informou que os documentos obtidos pelo "New York Times" refletem apenas uma parcela dos materiais de marketing do grupo e, assim, talvez representem indevidamente as suas atividades.


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